Cadáver

Já não tenho lágrimas nos meus olhos

excessivamente abertos

para aljofrar o cadáver podre da infância!

Esse morto que não morre

esse vazio que não enche

essa espada, esse abismo

essa faca de dois gumes

ferida que não sara

sangue que não estanca

dor, angustia e solidão ...

Já não tenho lágrimas nos meus olhos

excessivamente abertos

para aljofrar o cadáver podre da infância!

Esse poço de água suja

esse olhar que não desolha

essa terra de ninguém

esse aborto que apodrece

dor que gera dor

mentira que me enreda

pobre sombra desmaiada ...

Já não tenho lágrimas nos meus olhos

excessivamente abertos

para aljofrar o cadáver podre da infância!

Esse rosto sem ternura

esse corpo mutilado

esse olhar pesado e cego

esse filho indiferente

órfão de alegria

sem mãe nem pai

numa tumba sepultado ...

Já não tenho lágrimas nos meus olhos

excessivamente abertos

para aljofrar o cadáver podre da infância!