NOITE, NOSSO PARADOXO 
 
O dia é uma valsa, música clássica. 
A noite é o ácido, o distorcido som da guitarra.
As teclas do piano conduzem a sinfonia do dia, 
o som triste do violino encerra um Réquiem noturno.
 
[...]
 
Ah, noite! como é belo tocar o tecido 
que lhe cobre o prateado, 
sobre este tecido mora um deus queimado 
segurando o sol durante doze horas –
enquanto um copula na vizinhança do outro. 
Na virada do sexo, 
é o dia a se derramar de gozo 
e a noite morrendo aliviada.
 
[...]
 
À noite as coisas se tornam mais claras – 
Aquilo que se contempla durante o dia 
com sérias restrições, 
desaba numa carreira de cocaína, 
num cachimbo de crack, 
numa overdose por heroína.
 
De dia podemos enxergar os pássaros, 
as flores e garotas de tenra idade.
À noite nos acostumamos com os ratos, 
as baratas, as corujas, os peçonhentos, 
as prostitutas, os bêbados, 
os banheiros infectos e o frio ao relento.
O que negamos de dia, 
executamos pela noite... 
Esta é a noite, nosso paradoxo!
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RAIMUNDO, Agmar. Baladas de Sangue. São Paulo: Editora Giostri, 2020, p. 63.
 
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#cancoesdearetaeus
Agmar Raimundo
Enviado por Agmar Raimundo em 06/01/2021
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