Enganos Propositais ( Do lado de cá do muro )
Ela não me viu.
Continua não vendo.
Olha ,não sei como expressar tanto sofrimento.
Será que não existe lugar pra gente como eu ?
Na rua todo mundo viu o que aconteceu.
Foi um tumulto danado.
Como explicar o inexplicável?
Num álbum qualquer fui apontado na delegacia
Me deram um adjetivo que não merecia
Foi o suficiente para me jogar aqui.
Minha mãe não tem forças, nem consegue me visitar
Nossos amigos fazem rifa mas ainda doutor não deu pra pagar.
Aquela dá venda nos olhos não me viu nem ouviu
Sigo sem paz , muitos sóis e muitas luas.
Os dias se passam, todos iguais.
Nas minhas retinas só o cinza
Entre as barras de ferro o tempo escorre como a goteira que me faz companhia.
Eu que já fui ajudante , ambulante, mecânico e manobrista.
Tenho muitos calos nas mãos
Quase nada no meu barraco e a carteira sempre lisa.
Peço a qualquer um , ouça a minha voz.
Eu sou mais um engano.
Tem uma multidão de enganos que só se engana
Com quem tem a pele como nós
Enquanto isso vou definhando.
Os domingos são de dor e amargura
Do lado de cá do portão eu aceno.
Fico até o último segundo, quero chorar no sereno
Não me esqueça, já não suporto mais
Me liberte desse outro cativeiro
Liberdade não é só palavra
Meu último desejo:
Poder sentir a luz do sol de corpo inteiro