Enganos Propositais ( Do lado de cá do muro )

Ela não me viu.

Continua não vendo.

Olha ,não sei como expressar tanto sofrimento.

Será que não existe lugar pra gente como eu ?

Na rua todo mundo viu o que aconteceu.

Foi um tumulto danado.

Como explicar o inexplicável?

Num álbum qualquer fui apontado na delegacia

Me deram um adjetivo que não merecia

Foi o suficiente para me jogar aqui.

Minha mãe não tem forças, nem consegue me visitar

Nossos amigos fazem rifa mas ainda doutor não deu pra pagar.

Aquela dá venda nos olhos não me viu nem ouviu

Sigo sem paz , muitos sóis e muitas luas.

Os dias se passam, todos iguais.

Nas minhas retinas só o cinza

Entre as barras de ferro o tempo escorre como a goteira que me faz companhia.

Eu que já fui ajudante , ambulante, mecânico e manobrista.

Tenho muitos calos nas mãos

Quase nada no meu barraco e a carteira sempre lisa.

Peço a qualquer um , ouça a minha voz.

Eu sou mais um engano.

Tem uma multidão de enganos que só se engana

Com quem tem a pele como nós

Enquanto isso vou definhando.

Os domingos são de dor e amargura

Do lado de cá do portão eu aceno.

Fico até o último segundo, quero chorar no sereno

Não me esqueça, já não suporto mais

Me liberte desse outro cativeiro

Liberdade não é só palavra

Meu último desejo:

Poder sentir a luz do sol de corpo inteiro

Patricia Nogueira
Enviado por Patricia Nogueira em 24/02/2024
Reeditado em 12/03/2024
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