Canção do eu
 
 
Eu sou negro e bem feito pra mim!
Quem mandou não ter dado no pé
Enquanto podia ir para outro país?
Talvez uma Finlândia
Suécia
Canadá
República tcheca
Noruega
Ou simplesmente
Ter ido para a “África”
Ser amigo do rei
Como cantou Bandeira.
Pois o que é que
Estou fazendo aqui?
Não descendo dessa
Gente, desse lugar, desse país...
Sou estrangeiro, imigrante, invasor, corruptor...
Meu povo é preto,
Minhas raízes são escuras,
Minha religião é taciturna,
O santo desse credo é só
Um preto velho com um cachimbo,
Exposto em casas miseráveis
De adobo em pequenos
Quadros de 10X10 centímetros.
Meus ídolos?!
Ídolos da mídia não me convencem,
Luther king, Malcolm X, Zumbi,
Pantera Negras...
Um monte de picaretas!
Um monte de baboseiras
Religiosas disfarçadas
Para os livros de história.
Só respeito Mandela -
Porque passar 30 anos preso
Para libertar uma nação,
Isso é ser um salvador,
Um messias, sem fantoches
E sem fantasias.
Eu sou preto [cor];
O contrário do branco [raça];
É assim que me identificam.
Aqui, os contrários
Não se contradizem,
Hierarquizam-se!
Bem feito pra mim!
Problema meu! Vitimização?
Eu guardo os meus mi, mi, mi, mi’s
Pra mim.
Sofrer por Racismo,
Crime de ódio, injúria, é o mesmo que
Sofrer por Estupro – poucos denunciam,
E os poucos, são como agulhas
No palheiro: as chances de sucesso são quase zero.
Aqui só são pretas duas coisas –
A moral e a ética, que, perversamente
Tenho que discriminá-las usando
Esse tom de cor, mas é assim que é...
Sejam bem-vindos!




 
Do livro "Canções de Aretaeus" de Agmar Raimundo
 
Link do site para adquirir o livro:
https://viseu.bmkt.me/produto/cancoes-de-aretaeus/
Agmar Raimundo
Enviado por Agmar Raimundo em 29/07/2018
Reeditado em 30/07/2018
Código do texto: T6404132
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