AMEAÇA DE FOME

Hoje a fome não é breve

Ela é intensa e dura muito

A cruel fome machuca

E perdura nas entranhas mais profundas

A fome hoje persegue

Famílias na rua, desamparadas

Famílias na casa, assustadas

Famílias unidas e desestruturadas...

A fome hoje persegue em série

Milhares de seres famintos

Vistos como esfomeados

Um Bicho vil e desgraçado!

A crianças, idosos, jovens, adultos, e a outros animais parecidos

Resta a podridão do lixo

Lixo que alimenta estômagos vazios

Sano lixo para meros urubus personificados

Lixo para o lixo do povo

Um lixo consumado

Povo que trabalha e cansa de viver

Povo que já perdeu a esperança

De uma vida melhor

De um futuro neste passado

Que insiste em retornar e vigorar

Que custa tanto a passar

São tantas desgraças desgraçadas

Discussões por um pedaço de pão

São tantas injustiças acobertadas,

E que a Justiça são, aos olhos da Lei

Quem fez as leis?

Para quê foram feitas,

Se ninguém as respeita?

Para ricos coronéis latifundiários,

Para políticos corruptos milionários,

Para capitalistas exploradores...

Só pode ser isso!

Ao que parece, sim

A conjuntura é a estrutura deste país...

Faz parte da História

Está manchado na memória

Pintado com o sangue cor-de-rosa do povo...

Entre gritos e gemidos jamais ouvidos

O passado é História,

Mas a história nem sempre é o passado de fato.

Os miseráveis sempre existiram

Em quaisquer circunstâncias

Não, nunca houve mudanças

Nesta pseudonação,

Com tanta devastação,

Morre-se ainda de fome, miséria e moléstias...

Desde o dia da invasão

Desde os tempos do genocídio de nossos índios

Que índios? Quem lembra?

São todos um mero emblema

Enfeite de parede rebocada

Privilegiados com uma data

Sem nenhuma significação

Desde a época da escravidão...

Desde a época da escravidão?

Quem disse que acabou?

O passado é o presente

Os preconceitos ardem em mentes desprovidas da razão

Um presente igual e diferente

Que toda a gente sente

As vozes atrozes da opressão

E ainda assim consente

Digam todos juntos, então

Explorem-me até os ossos

Furem-me os olhos sem hesitação

E depois que não mais servir para servir

Joguem-me fora, longe daqui

Quero o lixão que restou para mim.

O povo diz tudo isso

O povo diz todos os dias,

Quando escolhe calar a boca

E ficar de barriga vazia

Quando escolhe tapar os ouvidos

Encolhido de cabeça baixa

Com medo de ouvir e recusar

Com medo de se revoltar...

Como não há escolha, aceita.

Aceita manter o ciclo da exploração

Aceita perder a indignação

Torna-se uma marionete ridícula

Um patético boneco, que diverte a todos

Menos a ele próprio.

Afinal, alegria de pobre dura pouco

E talvez não dure nada

E a meninada faminta não cansa de pedir

Na ausência de seus sentidos

Inconscientemente feliz...

Vamos lá empregados

Vamos lá meus criados,

Diz o ricaço patrão educado,

Deixem a preguiça de lado

Trabalhem até cair ao chão!

Não preciso de vocês

Vocês é que precisam de mim

As máquinas são melhores

As máquinas não adoecem

As máquinas lucram mais!

Mas parem um pouco,

Se eu mandar parar

Ora, vocês precisam descansar

Devem estar exaustos,

Mas apenas se eu deixar

Vocês precisam desse ganha pão

Vamos lá, vamos!

Vocês têm sede?

Continuem a me servir

Não vejo problema em demitir

Não quero gentinha revoltada aqui

Obedeçam sempre calados

Desistam de lutar por direitos,

Que nunca existirão...

O lixão está bem mais perto

Meus caros, sejam espertos

Conformem-se com o lixo

O lixo que tanto sonharam

Façam parte dele

Alimentem-se dele

Comam toda a porcaria que encontrarem

E vivam assim...

Vejo que vocês são tão, tão felizes.

Isis do Vale
Enviado por Isis do Vale em 13/10/2017
Reeditado em 13/10/2017
Código do texto: T6141248
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