Do Fundo do Poço ao Alto da Superfície

Sufocada em meio à poeira do poço em que caí, me agarro aos galhos secos que se amontoam sobre mim.

Um amontoado de coisas secas, sem vida, vazias e frias, lamentações sem fim...

"Quem toca o fundo do poço, consegue aproveitar melhor a luz da superfície."

Como um lampejo esse pensamento passou pela minha mente.

Como posso sair daqui, vou me agarrar ao quê para sair, se não tem mais nada presente?

Lembro-me do amigo que me disse essa frase, um ser tão bom, uma raridade.

Luz em meio as trevas, gentileza em forma de gente, nem parece ser de verdade.

Me pego a pensar na criação, na natureza, nos animais, e em algumas raras pessoas.

Tento me apegar ao que me mantém viva, nas poucas e raras coisas boas.

Um pingo cai como um algodão e se recosta abaixo do meu nariz.

E logo uma tempestade chega e minha mente me diz:

"Como posso sobreviver aqui nesse buraco que é um abismo ao meu olhar?"

Relaxo e aceito minha condição, não quero lutar, me deixo afogar, mas começo a boiar.

O topo do poço me assusta, muito barulho, muito clarão.

Havia me acostumado lá em baixo, silencioso, escuro, sinto palpitar meu coração.

Sinto que já não pertenço mais a superfície, a vida, a luz.

Sinto falta do silêncio da escuridão, que nos enlaça, e nos seduz.

Sinto, e sentindo, me pego a pensar.

Eu ainda estou viva, mesmo muitas vezes não desejando estar.

Carrego comigo caos, calmaria, luz, e escuridão.

E carregando, sinto, como um grão de poeira, um galho, um pingo, um ser indigno de salvação.

Mas fui salva, mesmo sem merecer.

E sendo salva, eu escolho e agradeço por viver!