CLAVE DE FÁ.
Escrevo sobre aquilo que não sou,
sobre o que eu gostaria de ser.
Minha vida hoje é sem graça, patética.
O que eu poderia contar?
Que sou preguiçoso?
Que sou vagabundo?
Que sou azarado?
Que sou sem controle?
Que sou idiota?
Que não vejo valor em quase nada mais?
Que estou desempregado?
Que estou fodido?
Que minha saúde tá uma merda?
Que penso em suicídio?
Que não deixam-me jogar o jogo e assim
empurram-me da janela?
Que sinto cada erro com cada pessoa que encontrei?
Que arrependo-me, mas ao mesmo tempo não, pois
penso que sou mais meu erros que os meus acertos?
Que sinto-me sozinho?
Que para levantar da cama, digo para mim que ela
ainda me ama?
Que sinto falta dela?
Que sinto falta delas também?
Que sinto-me cada dia mais velho e chato?
Que tenho afastado os meus irmãos
para não machucá-los?
Que na verdade eu tenho afastado todos?
Que nem sei escolher mais a cor das minhas meias?
Porra nem sei mais usar sapatos! Perdi o Habitus.
Que drogo-me pois de tudo isso nada
eu sei processar, arquivar ordenado e seguir em frente?
Que careço de abraços, mas sou estúpido demais para pedir?
Que as cores e os gostos inverteram-se dentro de mim?
Que tenho medo de ser um poeta tão ruim que
você nem leia até aqui?
Pois é, acho melhor só contar isso:
Lembra do “viver em constante rebento”?
Hoje faltou-me coragem.