Era um lugar

Era um lugar.

Um lugar onde não havia comida.

Era sem chance e sem piedade.

Era fome. Era dor. Era gente.

Revirando o lixo. Eu disse lixo.

Era fome. Era dor. Aquilo era mesmo gente.

Havia objetos que valiam muito.

E havia gente que não valia nada.

Havia gente com pele esticada.

E havia gente com pele machucada.

Habitavam o mesmo mundo.

Ainda assim, eram mundos diferentes.

Um, era barulho.

O outro era mudo.

Ninguém o ouvia.

O mundo é uma ferida grande e profunda.

Nós a cobrimos com curativos decorados, bonitos e caros.

Mas ela continua a doer.

Nós fizemos um mergulho profundo na hipocrisia.

E nunca mais retornamos.

Eram crianças. Com fome.

Eram crianças. Com frio.

Eram crianças mortas.

Esquecidas.

Era um lugar triste. Desigual. Cruel.

Ninguém parecia se importar.

Todo mundo, ali, vivia como se nunca fosse acabar.

Era gente que morria de frio.

Era gente que morria de fome.

Aquilo era mesmo gente.

Era um lugar.

Eu aqui. Você aí. E eles lá.

Com fome. Com frio. Era gente.

Era um lugar. E ninguém ia até lá para explicar,

Por que tanta desigualdade?

E, ainda assim, o mundo querendo se convencer da felicidade?

Minha felicidade torna-se medíocre e mesquinha,

Desonesta. Injusta.

Obrigada, mas eu não quero.

Eu insisto,

Eu não quero parecer feliz, nesse mundo triste.

Era gente com fome. Com frio.

E a minha tristeza diante disso,

Não me torna uma pessoa melhor.

Eu continuo na hipocrisia.

Porque é fácil ser triste daqui, sem fome e sem frio.

Thaís Carmo
Enviado por Thaís Carmo em 15/04/2017
Reeditado em 11/02/2019
Código do texto: T5971196
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