O espelho da vida

Ela caminhava calma e segura pela praia,

Andando como se não houvesse nada além ali,

Como se a vida fosse somente lá.

Mas a vida passou,

Com seu movimento a devastou

A colocou de joelhos, fê-la descer do salto,

Caminhar mais devagar ainda,

Correr incessantemente, loucamente,

Fê-la se sentir responsável pelo mundo todo.

Fê-la sentir todo o peso da vida em si só.

E ela cedeu.

Não sabia que a Fé era sua força.

Vagou longamente por estradas e morros,

Sem ser ela, sem ela mesma estar ali,

Por ruas e ruelas, por cercados e vastos bosques

Sem olhar pra nada, sem apreciar nada,

Sem esperar mais nada além da morte,

Pedindo e orando pela morte.

Carregar “seu” peso até que a morte chegasse:

Era isso, somente isso.

Um dia, no entanto, uma mão, movida pelo céu

Lhe pegou pelo braço, lhe colocou de frente ao grande espelho da vida,

Lhe obrigou a se ver, suas escolhas, nenhuma,

Suas vontades, nada

Apenas o peso.

E, naquele momento, olhando tudo, percebeu:

Podia suportar e continuar vivendo,

Sendo, se movimentando,

Percebeu que aquilo fora somente parte da sua vida,

Não a vida inteira, não o seu mundo todo.

Então, voltou ao seu quarto, tirou os sapatos baixos,

Colocou novamente, finalmente, seu salto, seus enfeites,

Saiu, depois de muitos anos, viva finalmente.

Marta Almeida: 20/12/2023