Traduzir-ze

Ando tentando fazer uma tradução da minha existência

mas não encontro o idioma ideal para tal proeza:

na língua lusófona sou bastante limitado nas sagas de Camões

singrando nos oceanos desconhecidos.

Na língua de Shakespeare sou demais ontológico

ou maravilhosamente metafísico!

Na língua de Kant e de Goethe sou muito complicado,

natural do alemão.

A tradução que se aproxima da minha realidade é o idioma de Alighieri

que mescla o paraíso, o purgatório e o inferno

numa escrita atemporal e rebuscada entre o mito e a realidade

que se delicia numa imagem justaposta

Tentar traduzir-se no tempo é uma tarefa difícil!

Algum idioma será capaz de traduzir uma existência?

Talvez o latim com sua consistente escolástica medieval

mas me enclausuraria numa dicotomia fé e razão.

Está ficando evidente que a existência supera palavras e definições

porque transcende o que é confinado em gramática.

Será que o aramaico, o hebraico, o grego antigo

mas são línguas mortas e continuo vivo.

Começo a perceber que a melhor tradução está no delírio

na insanidade

na linguagem, independente do idioma

na sensibilidade de um poeta.

Ou na obra esculpida pelo Criador que se chama existência

erodida pelas mistagogias e teogonias das angústias diurnas.

É arriscado um poeta fazer o papel de um filólogo

porque a melhor tradução para a existência

é que ela é uma arte!