DO QUE NÃO APRENDI

I

Aprendi... a dissecar a tatuada e frágil carne,

A doença fustigante que açoita o caminhar

A esvair-me pelo lento dissipar de toda tarde

A fraturar a liberdade, onda a estatelar no mar.

II

Aprendi... a triturar todos os ossos da saudade

Do esqueleto em vão preposto, sem direito de viver!

A não desviar a face, enfrentar a crueldade

Aprendi a dizer "não"!- ao tudo que nos faz morrer.

III

Aprendi... a enxugar até a última gota dágua!

Lágrimas de desespero, aprendi a acalentar

A mitigar o falso mel dos meandros das palavras

Sua denotação amarga, aprendi a figurar.

IV

Aprendi... a escalpelar a teia fina da epiderme

O fluir do sangue ralo a tão logo estancar,

Aprendi a decantar o tudo que com ferro fere

Pela mão que me conferem: também a me ressuscitar.

V

Aprendi... a traduzir quaisquer engodos dos silêncios!

E em versos de alento aprendi a consolar!

Aprendi me embriagar ao léu dos imprevisíveis ventos...

Revoltar-me frente aos tempos só a me desintegrar.

VI

Aprendi... a ser a manhã que nasce calma ao relento

Sem nenhum questionamento ao mistério do existir,

Aprendi a obedecer a esse todo tão sedento

Universo que enegrece quase já sem resistir.

V

Aprendi... tão doce ser qual a uma flor-criança...

Num jardim de esperança aprendi a reflorir,

Aprendi ser a aliança, mesmo na desesperança!

Nesses tempos sem bonança, sempre pronta a prosseguir...

VI

Aprendi... a aliterar todo meu verso em reverso

Ser fonema de ante-versos- surrealismo a solfejar,

Silabar o outro lado- meu desejo já confesso:

Ser só rima de protesto ao tudo a nos flagelar!

VII

Aprendi... ser coração no rítmo de bulhas ardentes

Doce alma adolescente, uno corpo de emoção

Dos delitos que atordoam a vida de toda gente

Meu diploma consciente: de ser gente em comunhão.

VII

Aprendi... todo o poder, a força vinda da eloquência

A ser plena irreverência no modelo em convulsão!

Mas eu nunca aprendi ser a ceifada consciência...

Tão furtada, em anuência, pela ética em extinção.

O que eu nunca aprendi...eu jamais seria, aqui.