Ponte ou abismo?

Cara Luísa, vou retroceder aos

Meus tempos de professor de

Crítica Literária, que tenho

Muito esquecida ... Eram tempos

Em que só podíamos, por costu-

Me ou por ordem superior, ex-

Plicar[-nos] em castelhano. Talvez

Um dos poemas a comentar fosse

Um de Blas de Otero intitulado (1951)

"CUERPO DE MUJER" / "Corpo de Mulher",

Soneto presidido por uma citação de

F. de Quevedo "... Tántalo en fugitiva

Fuente de oro". E dizia, ainda diz, acho:

...

CUERPO de la mujer, río de ORO

Donde, hundidos los brazos, recibimos

Un relámpago azul, unos racimos

De luz rasgada en un frondor de ORO.

CUERPO de la mujer o mar de ORO

Donde, amando las manos, no sabemos

Si los senos son olas, si son remos

Los brazos, si son alas solas de ORO ...

CUERPO de la mujer, fuente de llanto

Donde, después de tantaluz, de tanto

Tacto sutil, de Tántalo es la pena.

Suena la soledad de Dios. Sentimos

La soledad de dos. Y una cadena

Que no suena, ancla en Dios almas y limos.

...

Eram os anos do franquismo ditador. Ainda não

Nasceras, não te nasceram, e não era permitido

Nem se quem liricamente fazer poesia social.

Blas de Otero, então, lirizava em chave reli-

Giosa, quase mística, sobre testemunhos

Humanos ... E que mais humano que o

CORPO FEMININO, testemunho do

Melhor moldear divino ... A primei-

Ra figura não foi perfeita, foi só

Masculina, mas do segundo in-

Tento, já feminino, resultou

Tão perfeito quanto hoje

Estamos convidados a

Admirá-lo e agrade -

Cer ao Bom Deus

Tamanha feliz

Beleza cor-

Poral.

(Luísa, beleza, se fosse capaz, passaria a Português

Esse soneto. Entrementes quero lembrar que acaso

Nos servisse para nos exercitarmos literariamente.)