Novos Tempos

Hoje um velho amigo veio visitar-me em casa...

Surpresa - até então não recebo visitas;

Sou uma pessoa anti-social, minimamente;

Mas tem quem goste do meu anti-socialismo.

Já escrevo há muito tempo,

E ele deve ter achado onde eu morava de uns que lêem-me...

"Lá naquela fábrica, digo... Casa escura, digo...

Aqui, que surgem esses pensamentos, digo..."

"Que pensamentos moram atrás do ato de pensar? Digo..."

Bem, não importa. Estava escrevendo;

Ele deve ter visto a fumaça sobre as casas...

No meio do ato ele me toca a campainha:

(Ding Dong)

"Dizem os físicos quânticos que tudo o que pensamos pela vida

Materializa-se como átomos e saem vagando por aí;

Feito nossos corpos cheio de átomos.

Digo, neste exato momento colido em Mariana

Enquanto mudo o destino da caneta em minha frente:

Agora tu terás pernas, e viajarás o mundo!

Não serás só uma triste caneta em minha mesa.

Terás uma boa mente pra ficares sã;

E farás das tuas manhãs, primaveras; e o teu sono -

Arquitetura em que as flores sonhem com elas mesmas.

Com o acordar delas mesmas. Quatro estações de primaveras.

Assim viverás, e assim morreras.

A vida será fácil pra ti... Pois assim digo."

"Queria morar num universo quântico..."

(Ding Dong)

(As vezes esqueço se sou eu ou os versos)

(Ding Dong...)

(Acho que sou um rascunho quântico que alguém fez, leu - e jogou fora...)"

(Ding Dong) Quem é? (...)

Plena segunda atarde, começarei a colocar placas:

Aviso, não perturbe! Homem oco trabalhado!

(Ding Dong) Ah! Droga... (...)

Peguei o casaco e fui olhar a janela -

Quando em um instante,

Todos os sóis de minha infância cegam-me os olhos;

Todas as antigas ruas, e as brincadeiras -

Erguem-se

Como uma represa se rompendo;

Como um pensar quântico - tão material

Que escurecem-me os sentidos,

Que estilhaçam as chaminés

Da fábrica, dos olhos!

(Ding Dong)

Não sabia o que fazer... Não estava preparado!

(Ding Dong! Ding Dong!)

As brincadeiras de pique, a velha praça abandonada,

Tudo retorna! As tardes de Dezembro,

O cheiro das batatas fritas, retorna

Como átomos frenéticos;

Trilhões deles querendo invadir o futuro

Pelos buracos de minhocas dos presentes!

Todos

Borbulhando

Como um big bang

Em cada aperto que cegavam os toques

(Ding Dong)

Que vou fazer, ele não pode me ver assim?

(Ding Dong)

A casa suja, bagunçada, o teto acabado

O peixe no aquário morreu, e invés de o enterra-lo,

Joguei seu corpo em poesias...

(Ding Dong)

E o meu corpo magro...

(Ding Dong)

Não há o que pensar,

Preciso me despir do corpo!

Mas como?

(Ding Dong)

Da mente...

(Ding Dong)

Lembro que fizemos uma aposta...

(Ding Dong

Sobre quais seriam os mais felizes,

Sobre quais sairiam mais ilesos do jogo da vida

(Ding Dong)

Distante viviam os nossos olhos, a nossa sorte

(Ding Dong)

Estava em muitos lugares

Menos

Aqui...

(...)

Basta olhar à fresta e fica claro quem ganhou...

Basta olhar da luz... Que cega...

(...)

A campainha não toca há um tempo

Acho que ele foi embora...

(...)

Me sentei no chão e escorei-me à porta

E fiquei ali,

Um longo tempo fitando a sala...

Dava pra ouvir os tics do relógio na cozinha...

O cheiro do limo na parede... No meu corpo...

A casa estava escura... E inda era dia...

Pensamentos vem, pensamentos vão...

Inexpressos como aquele acaso...

Procurei lembrar o que fazia antes daquilo...

Não importava...

Uma vida inteira havia se passado...

Terminei tudo escrevendo estes versos...

Se ele vier aqui outra vez?

Não sou ninguém. Sou um estranho.

Outros sonhos. Outra vida.

Tudo que posso fazer e não atender o momento.

Pois sempre estou ocupado pra estranhos.

(Cachoeiras quânticas escorrem dos meus olhos, mas não choro;

Pois assim como elas, faço parte de outra atmosfera...

Mas ainda assim, sinto-as... Sofro-as...

Talvez os físicos estejam certos...

A caneta sorriu pra mim...

E eu enfim...

Chorei...)

Preciso voltar a escrever...

- Berserker Heart