O Relógio

De tanto que perdi tempo mesmo por este mundo aqui

Agora vou-lhes narrar um negócio passado

De muito antes de toda essa parafernália surgir

Um dia, numa correria infernal, passei olhando de lado,

A passos bem largos, prum relógio de parede bem colocado

E o velho relógio então, sem parar, me tiquetaqueou assim:

– Meu filho por que toda essa pressa, querias ser alado?

Sem nem atinar que um relógio, sim, me havia falado,

Procurando em vão o relógio sumido do pulso atrapalhado:

– Mas é que meu bonde, da praça já sai logo a mil daqui!

Irmão da bússola, só podia me querer deixar desnorteado

E conversando sem parar, me deixando mais atrasado

O marcador de horas, que não parecia ter horário marcado,

Seguiu segundos marcando, tomando minhas horas com tal bate-papo:

– Mas vou estar aqui do mesmo jeito girando, enquanto derem corda em mim.

Não convencido, corri, das pernas atropelado

Chegando meu nariz ao batente antes mesmo do experiente sapato

E, constrangido, coçava a cabeça, ora, mui mal sentado

Irritou-me o velho relógio, pois me pareceu, badalou de rir:

- Meu filho, meu trabalho não para, gosto de tudo encadeado!

E com escárnio o contador de horas seguiu seu rumo bem aprumado

Mal ajambrado que estava, queria deixar o relógio desalinhado como eu ali!

Ameacei saltar-lhe direto como um louco dardo

Mas o tratante não me dava bola, só dava as horas sem fim.