DIA DO COMISSÁRIO E CAMISSÁRIA DE BORDO

Tornei-me sátiro da proclama,

Do interior saída para o exterior bem vinda,

em distintos pólos me situo sobre drama,

a dimensão do corpo na escrita projetada,

à flor da pele uma sensibilidade infinda.

Metáforas, imagens, literatura busco,

onde o "eu" desmesuradamente aberto se encontra,

exposto a todos os perigos, dilacerado e brusco,

inscrita a morte como impenetrável horizonte me afronta,

próxima e distante ao mesmo tempo, se agiganta,

agente de fascínio, sem declínio também repelente ali se faz...

Me fiz aeronauta, minha vida coloquei em pauta,

Comissário de bordo, sem rebordo, me fiz,

Feliz eu fui, me reparti em tanta gente,

e diligente, em tanta parte estive,

Não me contive, de voar era alegria vigente...

Homens e mulheres nas alturas, insones velam,

e zelam dos passageiros o bem estar.

Uma nuvem negra sobre nós se abateu,

o leme de profundidade em estol se converteu,

hoje, sobre a alma a doença se instala,

na ante-sala a morte se avizinha!

É uma dor moral que ao coração contrai,

na contramão o sonho se esvai, lá vamos nós,

você, eu, todos que somos aviadores,

sem encontrar um lugar que consola,

sem recompor a vida que estiola,

formando uma procissão de sofredores...

Deste rumoroso passar que orienta,

a uma paradoxal lembrança na cabeça se assenta,

até que esmoreça, vincos de ouro vida viva,

Presente, rediviva em remota esperança que não alcança,

pressentindo os próprios gânglios do mal que caminha...

O sonho de Ícaro se desfez, é chegada a hora e a vez,

acionado um mecanismo de desastres,

volantes falsos, visões de cadafalsos, cabeças rolam,

num desespero criado com esmero, rigorosa escrita,

por esta força do mal a si restrita, num vandalismo bestial...

A você comissário, a você comissária de bordo,

é que esta escrita bordo, vocês são demais,

sem iguais em saber e harmonia, esquecendo o drama,

o meu verso se derrama sem diafonia.

Ah, poder exprimir-me todo como uma aeronave:

Singrar os céus, postar-me triunfante, ser completo como ela,

mentalmente abrir a provável cancela,

Poder ao menos penetrar-me fisicamente em tudo isto,

Abrir-me completamente, absorvendo perfumes, aloés e unguentos,

Inebriado, dominando o mundo inteiro...

À dolorosa luz do saber das grandes lâmpadas,

numa febricitante vontade é que escrevo,

rangendo os dentes descrevo, tendo os nervos dissecados fora,

este mal que a todos aflora, abateu-se sobre nós...

Apesar de toda esta trama, este dia, hoje dia, nosso dia,

Humanos de ferro, e fogo e força somos, vamos nos abraçar,

e cantar, cantemos o presente, e também o passado e todo o futuro,

justo porque houve o outrora, já é hora prá renovar...

De fé e calma precisamos, distante destas sensações confusas,

Que Deus acabe com tudo isto, abra as eclusas e a água livre escorra,

Sobre nós, pobres mortais que somos, limpando tudo de mal que sofremos!...

Carlos Lira

30/05/2012

clira
Enviado por clira em 30/05/2012
Reeditado em 12/07/2017
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