Carta à uma desconhecida

Você tirou um filho

E eu nem cheguei a ter um

No seu caso, foi imposto

No meu, solidão

Você casou

Mas não foi feliz

Não casei

Mas também não fui

Você abriu mão de seus sonhos

Por alguém que nunca deu valor

Eu abri mão dos meus

Por não encontrar meu valor

Você sofreu

Eu também sofri

Cada um no seu canto

Cada um no seu conto

Vivemos dores juntos

Mas separados

Unidos na desunião

Pelos desencontros encontrados

Enquanto diz:

Antes só, que mal acompanhada

Digo:

Quando se é só, até mal acompanhado

Contradições da vida

Seria diferente

Se tivéssemos nos achado

Mas não há tempo de nos fazermos rogados

Quando me diz:

Gostaria de escrever para ser lida

Retruco:

Mesmo escrevendo, não somos

Os caminhos seguem

As coisas mudam

O que nos espera?

O que esperamos?

Nada importa

Só o nosso portar

E o acreditar no sorriso

Que ainda devemos dar