Procura da Poesia - (Drummond)

Procura da poesia

[...]

Penetra surdamente no reino das palavras.

Lá estão os poemas que esperam ser escritos.

Estão paralisados, mas não há desespero, há calma e frescura na superfície intacta.

Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.

Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.

Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.

Espera que cada um se realize e consome

com seu poder de palavra e seu poder de silêncio.

Não forces o poema a desprender-se do limbo.

Não colhas no chão o poema que se perdeu.

Não adules o poema. Aceita-o como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.

Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra

e te pergunta, sem interesse pela resposta, pobre ou terrível, que lhe deres:

Trouxeste a chave?

[...]

Carlos Drummond de Andrade
Enviado por Raio Eterno em 18/03/2013
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