À minha zona realmente confortável

Escrevo esse textinho à minha rede de apoio, como parte do meu processo terapêutico.

Em todas as análises sobre meu processo de luto, concluo que eu "estou aqui". Triste e exausta. Sobrevivendo dia após dia à minha rotina caótica de professora durante o dia e de estudante durante a noite. Mas tem dias que não sobrevivo e a única coisa que consigo fazer é me deitar e deixar a vida passar.

Durante a semana me coloco diante dos meus 800 alunos. Nos dias bons finjo um sorriso, faço a minha tradicional roda de conversa e lhes ajudo a interpretar suas próprias vivências e a alegria fingida acaba se tornando natural no decorrer das aulas.

Mas têm dias que o movimento de escrever sobre o quadro ou emitir uma simples frase se torna um desafio gigantesco. Já perdi as contas de quantas vezes minhas explicações teóricas se emendaram às lágrimas.

Nesses dias ruins da vida adulta, costumo receber aquele sermão de que meu trabalho não está saindo tão bom como esperavam, que eu preciso guardar as minhas questões pessoais e me colocar ali apenas enquanto profissional. Mas nem sempre consigo esquecer que sou uma pessoa.

E quem me conhece sabe como sempre confrontei minhas limitações como pessoa, fazendo mil atividades ao longo da semana com direito a happy hour no fim do dia e até viagens no fim de semana.

Mas há 3 meses eu não consigo esquecer que sou uma pessoa e que essa pessoa carrega feridas, limitações e está extremamente exausta. Não consigo esquecer que sou uma pessoa que "está aqui", há três meses, seguindo em frente sem a minha base.

O que posso dizer desses 3 meses é que todas as vezes que busquei apoio eu encontrei. Sempre que busquei a minha zona realmente confortável, ela me recebeu com um afago que nunca imaginei encontrar nem merecer.

Por vezes, quando me vêem alegre e me divertindo, me perguntam se superei. A resposta é não e acho que não mudará. Estou apenas me adaptando ao vazio enquanto encaro a barreira do "nunca mais".

Ainda estou seguindo em pedaços e mesmo juntando meus caquinhos diariamente, pode demorar um, dois, três dias... Eles se espalharão novamente e terei que catá-los mais uma vez. Mas ainda estou aqui...

maria paula da silva lima
Enviado por maria paula da silva lima em 22/04/2024
Reeditado em 22/04/2024
Código do texto: T8047386
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