O exibicionismo

O maior truque de um mágico é a distração. Quanto mais exibicionista ele é, mais distraídos ficamos, mais encantados, intrigados e envolvidos terminamos o show.

Encantados e intrigados frequentamos um show diariamente a ponto de nos prender por horas, enquanto nossas vidas se embolam, o tempo do nosso descanso se esvai, nossas relações humanas ficam frágeis e ficamos mais frustrados. O exibicionismo é o ingrediente principal de uma receita que ainda não conhecemos o sabor, vemos, ouvimos, mas sequer entendemos todas as dimensões de delegarmos nossas vidas às telas. Um show de mágica, qualquer semelhança com as redes sociais é mera coincidência. Enquanto pessoas exibem o que querem, desfocando seus principais problemas, dilemas, outras que assistem se comparando as versões irreais daquele que expõe na prateleira: emoções, sorrisos, viagens, fotos e vídeos de encontros nada secretos com o altíssimo. Isso tudo porque a nossa geração 1990/2000/2010 encontrou no exibicionismo a distração necessária para viver seus dias, para resolver as próprias carências, para obter lucros, para pedir socorro…

E no final do dia repousar a tela ao lado da cabeceira a espera de um novo amanhã, de uma rotina corriqueira entre desejar o topo e se frustrar com a queda.

Um copo “dourado” no fim de semana, simplificando a fuga do trabalho. O excesso de "eu te amo" na legenda que oculta os desajustes conjugais. O sorriso aparente que esconde a angustia incessante. O excesso de trabalho que esconde a incapacidade de encontrar valor na inutilidade. O significado do ser que se perde enquanto nos comparamos com o que não temos. Enquanto ávidos por resultado, negligenciamos as fases, os processos, a trajetória que todos nós precisaremos passar. E quando ágeis em julgar, desaprendemos a esperar, a ouvir, a nos frustar.

Qual bem querer é sem dizer? Quem pode ouvir cada palavra da nossa oração? Quem nos assiste quando nem mesmo nos enxergamos? O que somos no secreto, onde não há adjetivos alheios?

Enquanto a neblina esconder este mundo de aparências, sejamos corajosos em não nos esconder do nosso caos. Enquanto conveniente for nos exibir ser vasos perfeitos, tenhamos coragem de entrar na olaria no claustro do anonimato.

KD.

29/10/23