eu sinto falta do normal

eu tenho tido saudades do que era a vida normal, já que hoje, o mundo virou de cabeça para baixo e tudo virou anormal. eu tenho pensado se eu era feliz na normalidade que havia antes. posso não ter sido a pessoa mais feliz do mundo, mas não tenho me sentido feliz nesse novo normal. o que eu verdadeiramente tenho me questionado é se algum dia existiu o normal ou o mundo sempre esteve assim e só não percebemos?

são dias difíceis, de semanas difíceis, de meses difíceis... de um ano difícil... que se transformou em mais um ano difícil. tanta coisa aconteceu, nem sempre boa, o que me fez questionar tudo o que me rodeia e quem eu sou, em meus dias mais sombrios.

percebi que nunca sei qual resposta dar quando alguém me pergunta como eu estou. há muito tempo não sei como estou realmente. mas, creio que não sou apenas eu quem não sei como estou. há muitos como eu quem não sabem como estamos.

e, como está o mundo diante disso tudo?

eu tenho me esforçado para ficar bem, na maior parte do tempo. todavia, eu confesso que tive algumas recaídas, abraçando os meus dramas e revoltas, planejando motins aleatórios, me sentindo mal por alguns dias (mais que necessários), me sentindo culpada. só que eu não posso pensar assim, pois nunca tivemos passado por isso antes, não é mesmo?

então é normal ficarmos apavorados desde que tudo começou. eu fiquei e ainda estou, pois não me acostumei como o resto das pessoas. tudo parecia um apocalipse misturado com uma profecia asteca que se cumpriu. a forma como tudo foi acontecendo, a forma como as notícias apareciam nos jornais, era assustadora. a forma como tivemos que mudar a rotina e ficar em casa, longe de tudo e de todos, foi aterrador – mesmo eu não sendo a pessoa mais sociável.

em um dia, uma certa taxa, semana após semana, que dobrava, começou a diminuir e voltamos a respirar. era realmente tudo inacreditável. até que apesar de todas as coisas contra, as coisas estão melhorando aos poucos. a doença nunca vai morrer, eu sei. ela vai continuar nos ares e devemos continuar vigilantes. a única coisa que vai abaixar é os casos.

mas não é só a doença que nos assombrou. a sanidade também foi prejudicar. não há quem tenha ficado isento dos efeitos que o medo, o isolamento, a morte provocou em nós, que somos sociais e tudo nos atinge.

eu sou muito sensível. uma pessoa frágil que só mostra a sua força para não desmoronar. mas eu me revoltei e me entristeci em muitos momentos. e tudo bem! só mostra que sou humana. eu tenho tentado ficar bem. tenho tentado ser um ser humano melhor.

antes eu saía de casa e esquecia minhas chaves ou a carteira. hoje não deixo nada para trás. se esqueço máscara, dou meia volta... tudo virou rotina e me impressiona a forma como o ser humano consegue se adaptar em certas situações, mesmo que eu veja muito a negação dos fatos. devo confessar que, pelo menos para mim, não vejo mais o mundo voltando ao normal. eu não consigo imaginar um mundo sem máscaras no rosto das pessoas, ainda é difícil para mim criar essa imagem em minha cabeça.

(e o que seria de mim sem as máscaras, que escondem as minhas expressões faciais, sobretudo as de decepções e revolta – hoje mesmo a máscara escondeu minha cara de decepção, mágoa e choro – algo que eu nunca deixarei alguém me ver, ainda mais se eu estiver chorando de raiva por uma injustiça).

às vezes eu sinto falta do antigo mundo – mas eu não sou mais aquela pessoa.

Belinda Oliver
Enviado por Belinda Oliver em 14/10/2021
Código do texto: T7363715
Classificação de conteúdo: seguro