O PARADOXO DO BEM

Esse texto baseia-se no livro "Vida e Destino", de Vassili Grossman., capítulo 16. Vassili escreveu esse livro em uma década, relatando sua experiência como correpondente na Batalha de Satlingrado, a mais sangrenta e longa de toda a Segunda Guerra. Boicotado, o livro demorou mais duas décadas para ser publicado e mais três para ser liberado pelo serviço secreto russo.

O PARADOXO DO BEM

Valores há, para nós seres humanos, que por mais que busquemos uma definição definitiva, sempre ocorrerão divergências entre pensadores, religiosos, países, religiões, ideologias, psicólogos, e outros formadores de opiniões. Os criadores de religiões, de sistemas políticos, de leis, e tudo que é sugestão de comportamento humano, acreditam que seus seguidores serão beneficiados obedecendo aos pensamentos deles. Significa isso que serão agraciados com o bem? Poderão desfrutar de melhoras em algum aspecto de suas vidas. O que vem a ser o “bem”. Como definir o “bem”? O “bem” de quem? O “bem” para quem? Existirá um “bem” universal, que beneficiaria todos, em todos os aspectos da vida? O meu bem é o seu mal ou o bem do meu povo é o mal do seu povo? O bem de hoje é o mal de ontem ou vice-versa? Existirá um bem imutável para e eterno? São perguntas que somente serão respondidas no Juízo Final, caso exista, e mesmo assim objeto de muita discussão entre pensadores. Será que ao longo das Idades da História, o homem evoluiu na compreensão do bem? As infinitas conceituações do que é o bem pelas incontáveis noções morais e filosóficas criadas por guias da Humanidade reduziram em muito a definição do bem. Criou-se o bem dos cristãos, que teve que conviver com o bem dos budistas, dos muçulmanos, dos judeus. Ainda assim os cristãos dividiram seu bem com os católicos, os protestantes e os ortodoxos. E cada linha dessas subdividiu-se em várias outras cada uma com o seu conceito de bem. Alguém duvida que Herodes acreditava fazer o bem? Ou os centuriões de Roma castigaram Jesus por pura maldade? Ou, o pior de todos, Adolf, queria o mal da Alemanha? Eles agiram em defesa de seu povo, de suas crenças, de sua família. Assim foi com muitos e muitos que provocaram atrocidades acreditando estar fazendo o bem. O bem de uns é o mal dos outros. Quantos milhões foram assassinados em nome do bem, somente por que um idiota cognominado de gênio inventou uma receita ideológica que os discordantes deveriam serem banidos? Fosse para sermos iguais, Deus assim o faria, pois não precisa de nossa ajuda. Mas a bondade, a solidariedade, o que são? É muito cômodo ser bom para com os amigos, companheiros, e outros próximos fisicamente ou não. A verdadeira bondade e maior expressão do humano é a bondade insensata. Mas o que é isso? É aquela que vemos quando um atleta abandona a prova para socorrer um adversário caído, o soldado oferece seu cantil para um inimigo ferido, a mulher que cuida de um soldado invasor de sua casa. O carcereiro que entrega a correspondência de um preso à família. Justamente essa bondade estupida e insensata é o que há de mais humano. Diante de exemplos assim e da luz das pessoas que a praticam, o Estado empalidece. Esse o bem de Jesus, Buda, e outros tantos. Mas não aprendemos.

11/05/2020

Paulo Miorim

Paulo Miorim
Enviado por Paulo Miorim em 11/05/2020
Reeditado em 26/01/2022
Código do texto: T6944027
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