Uma nova vida

Lembro de uma conversa que tive a um tempo atrás e tocou meu coração,

estava eu em um restaurante e na mesa ao lado havia um cidadão.

Se mostrava preocupado e seus olhos

confirmavam que estava bastante angustiado.

Em alguns momentos ele me olhava e parecia querer conversar e compartilhar com alguém o que te incomodava.

Tomei a iniciativa e da mesa me aproximei,

estirando minha mão, a ele me apresentei,

ele retribuindo a cortesia, apontou para a cadeira e aceitou minha companhia.

Foi daí que percebi o tamanho de sua necessidade,

pois sem ao menos me conhecer compartilhou comigo a sua intimidade.

-Obrigado pela atenção em vir me ouvir,

Vou te relatar o porque estou assim.

-Venho de família pobre, em casa era eu, minha mãe e meu pai,

morava em um sítio, numa região onde

pouca chuva cai.

Ajudava meus pais no que tinha para fazer,

e ainda ia a escola para poder ler e escrever.

Sonhava com a faculdade, mas achava que o sonho estava distante da minha realidade.

-Meus pais vendo meu interesse pela “leitura”, pediu que eu me dedicasse aos estudos e largar a ajuda na agricultura.

O tempo passou e eu terminei o colegial,

e pela minha dedicação, consegui minha aprovação na universidade federal.

Meus pais e eu éramos só alegria,

orgulho eles sentiam de mim, e uma gratidão a Deus sem fim.

-Mas como eu iria para a cidade grande, se dá terra onde vivia era bem distante?

Meus velhos com toda felicidade e amor, não mediram esforços para ver seu filho, um doutor.

Foi um tempo de muita dificuldade,

Eles trabalham duro para me manter na cidade.

E uma vez perdida eu conseguia uma carona e ia matar a saudade.

-Mas alguma coisa em mim mudava, toda vez que ia pra lá, qualquer coisa com eles me chateava,

e naquele canto eu não mais me acostumava.

-Meus pais estava perdendo a aparência,

a pele enrugada e avermelhada, perdia a essência.

Me pediram por vezes para irem me visitar,

logo eu arranjava uma desculpa dizendo que nesse dia ia um seminário preparar.

Mas na verdade,

era pra sair com a turma e farrear.

-Certo dia estava em casa com um grupo, realmente estudando,

alguém batia na porta e um amigo foi lá fora,

e com duas pessoas via entrando.

Um susto tomei vendo meus pais alí na sala,

olhei para meus amigos, e muitos deles “mangava”.

Queriam eles me fazer uma surpresa e por isso não tinha avisado,

e eu com uma avareza medonha, disse a eles estar com vergonha.

O sorriso no rosto do meu pai se desfazia,

fui abrindo a porta e os dois de cabeça baixa saía.

-Depois daquela cena só tive notícias uma vez, que meu pai havia adoecido, mas minha real preocupação era que daqui a sessenta dias seria minha formação.

Como não tive mais notícias também não procurei, depois daquela vergonha, nem o convite mandei.

E o grande dia chegou, fui receber meu diploma, meu sonho se realizou.

Ia trabalhar, e continuar me especializando,

construir minha própria clínica esse era meu plano.

-A cada ano que passava por muitos pacientes era procurado,

era bem requisitado e fiquei bem afamado.

Construí minha clínica, comprei uns maquinário, e para exame e consulta tinha que ser tudo pago.

Uma vez voltando de um congresso no meu consultório rápido entrei,

Em cima da minha mesa um envelope de exame e uma carta me deparei,

estava cansado que nem importância dei.

Coloquei na minha pasta, entrei no carro e fui descansar em casa.

-No dia seguinte fui trabalhar mas me sentia muito cansado,

acabei passando mal e fui hospitalizado,

e depois de exames fui as pressas internado.

Meio inconsciente lembro de ouvir vozes e uma me chamou atenção,

- “Ele vai morrer se não fizer o transplante de coração”.

Em seguida uma voz em meu ouvido sussurrava, não conseguia abrir os olhos, mas essa voz eu muito me lembrava.

“Seja forte meu filho, que Deus vai te curar, seu pai não pode vir, mais dele você irá se orgulhar”.

-Depois daquelas palavras não me lembro mais de nada, e o mundo naquele momento para mim se calava.

Quando acordei percebi que há dias alí eu estava,

e que de uma séria cirurgia me recuperava.

Em seguida entra um amigo cirurgião,

e me relata que a cirurgia tinha sido de transplante de coração,

que ocorreu tudo bem, mas que eu tivesse muito repouso para minha recuperação.

-Foram acompanhamento, exames, medicação, e depois de longos dias

recebi alta depois de uma última avaliação.

Fui na ambulância para minha casa repousar,

no caminho comecei a pensar,

se não fosse aquele coração, minha fortuna poderia me salvar?

Quem teria sido o doador, e essa família com todo esse gesto de amor?

-Lembrei dos meus pais que por minha culpa,

há tempos não os vejo mais.

Me lembrei do sussurro da minha mãe me encorajando,

e tenho certeza que por mim continua rezando.

Do meu pai sem mesmo saber o que tinha feito, quando dele me lembrei, deu logo um aperto no peito.

Cheguei em casa vi tudo limpo e organizado, enquanto me sentia só, e desamparado.

Nenhum e-mail ou mensagem de celular,

o que adianta ter fortuna e me sentir pobre de atenção nessa sala de estar?

Levantei a cabeça vi minha pasta, e ao lado dela estava aquele exame, a carta e outro bilhete,

o envelope era no nome do meu pai e abri na mesma hora,

falava de um problema nas vias respiratórias.

Peguei a carta e fui ver o que tinha, era a letra da minha mãe e assim ela dizia:

“Filho Deus te abençoe, e se estiver incomodando,

me perdoe.

Fui até sua clínica falar sobre seu pai,

ele não está nada bem, como disse no recado a um tempo atrás.

Consegui pelo SUS um tratamento, mas recentemente ele teve um agravamento.

Antes de ser internado disse que te amava,

que de ti sentia orgulho e que perdoava sua falha,

e não queria te fazer passar vergonha lá na sua casa.

Esses dias ele sonhou e me contou com muita emoção,

no sonho ele ia morar no céu,

mas ia deixava pra você o coração.

Aguardava sua visita cheio de ansiedade,

para te dar um abraço cheio de saudade”.

-Me deu um desespero um vazio danado,

queria ter os dois agora para poder abraça-los.

Peguei o bilhete que ainda faltava ler,

foi quando meu mundo começou a estremecer,

o meu pai não resistiu a doença e veio a falecer.

Foi no mesmo dia em que as pressas fui internado, e ele era o dono daquele coração que me foi doado.

Em meio ao meu pranto vi que no meu peito meu pai vivia, minhas lágrimas era de tristeza e alegria, pois dentro de mim, ele para sempre será minha companhia.

Pois ele ao menos sem imaginar, estaria dando a sua vida para a minha salvar.

-Só quero ver minha mãe para abraça-la e pedir perdão,

fazer ela sentir o pulsar do meu novo coração,

agradecer por tudo que fez por mim, e gratidão ao meu pai, levarei até o fim.

Minha mãe quero ela do meu lado,

aproveitar esse tempo desperdiçado.

Quero construir também minha família,

e dizer ao mundo de que uma nova vida eu ganhei.

E seguirei o que Jesus disse:

“Amai-vos uns aos outros, como eu vos amei”.

Nesse momento ele se levantou, me pediu um abraço e depois falou:

-Preciso ir, vou visitar minha mãe amada,

dizer a ela que sem os conselhos dela não sou nada.

E lembre-se amigo, não há dinheiro que compre a felicidade, ame teu próximo de verdade,

e se for sua família, os ame por toda a eternidade!

Aquele homem saiu por aquela porta, talvez não o veja nunca mais,

e a sua história, eu não esquecerei jamais!

Ualisson De Assis

Ualisson de Assis
Enviado por Ualisson de Assis em 28/03/2018
Reeditado em 03/04/2019
Código do texto: T6292905
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