TODO DIA...

Meu imaginário sobre as coisas e o meu entusiasmo vivem como duas crianças a brincar de esconder no jardim, camufladas por entre os arbustos...

São como duas borboletas amarelas brincando ao redor de uma flor...

Sempre tento não permitir que meu sentimento descubra o que minha imaginação está realizando enquanto escondida... Então, abstraio-me das sensações todas, na esperança de ser ágil e realizar-me imaginando, genuinamente. Mas, afeições escapam...

Ontem, no mesmo banco dos fins das tardes, numa dessas conversas casuais, das que compreendo ter, na plenitude da minha irrealidade corriqueira, questionei sobre ser possível a imaginação esconder-se das sensações.

- Não entendi sua pergunta!

- Disse que, olhando o seu sorriso, lembrei de um lindo por do sol visto da ponte sobre o rio São Francisco, pertinho da ilha do fogo.

- Ainda não compreendi muito bem... Tenho medo de pontes, fogo, etc. Acho perigoso, mas... Tem gente que se arrisca.

- Sei... Ruim pensar assim, mas seu sorriso, realmente, passa uma luz. Vendo melhor, talvez, nem haja sol e nem ponte. Mas, há um sentimento indefinido nele...

- Ah! Já me disseram isso. Talvez eu sinta, sem nunca tê-lo imaginado, mas, já que insiste nisso, devia me dizer o que sinto, ou sente, ao me ver sorrir... Mas, olha!! Veja aquelas borboletas!! Parecem brincar de esconder...

- Talvez a percepção de si mesma não permita imaginar sentir, o que realmente sente ao sorrir, e nem ver a tal luz que vejo. E as borboletas... sim, estão a brincar. Todo dia estão aqui.

- Nãããoo... Que coisa maluca! Diferente das borboletas, pois são reais, acho que não existe nenhum sentimento, nem muito menos essa tal luz. Melhor mudarmos de assunto... Deve ser a sua imaginação criando tudo, como a nós mesmos, e esse tal sorriso. O que acha?

- Não sei... Estamos conversando e eu pretendia descobrir um modo de completar realidades aos sentimentos, sem usar palavras, ou, ao menos, sem parecer usá-las, como as borboletas, criando e caladas... Acontece que, no seu sorriso, busquei, em silêncio como essa flor, um significado das realidades, sem neles conceituar sentimentos. Mas, decidi perguntar, pois qual realidade teria um sentimento da palavra, ou da sorriso, ou da flor se não há o que ouvir? Por isso imaginei te perguntar...

- Isso que você disse até soa bem mais coerente, mas, também, parece não ter sentido nenhum. Que coisa... Luz, sorriso e ponte, foi você quem criou, mas as borboletas e a flor, não! Essas eu vejo! Eu só queria mesmo que você me dissesse porque essa nossa conversa está acontecendo? Ou se realmente está acontecendo?

- Até pouco tempo atrás, achava que sim. Mas, agora não sei ao certo. O que posso afirmar é que, se você não tivesse me respondido seria bem melhor, pois meu sentimento não teria descoberto a minha imaginação de tê-la visto sorrindo, nesse banco, enquanto estou aqui sozinho, vendo duas borboletas brincando numa flor do jardim como crianças.