Você é um "bostinha" de Clóvis de Barros Filho

O jornalista e professor Clóvis de Barros Filho publicou um vídeo entitulado: "você é um bostinha" no youtube. O professor, sempre sarcástico e com um humor bastante ácido, critica a motivação que faz com que as pessoas obedeçam à Deus: “agir ou por esperanças que vou me dar bem ou por medo de me dar mal” não seria genuíno, segundo ele. O "desinteresse" em obter uma recompensa ao agir fazendo o bem é o que demonstraria uma fé "real". Embora ele seja infeliz ao usar palavras como "bostinha" e termos que reduzem a importância de uma pessoa e apele para o desdém agredindo verbalmente quem pensa diferente dele, é possível captar a essência da mensagem. Pelo que percebo talvez a estratégia usada seja para prender a atenção das pessoas, visto que infelizmente xingar e dizer coisas duras acabam gerando mais audiência. Mas não estou aqui para refletir e pensar em como é difícil usar as palavras de maneira que não fira outras pessoas ou que não lhes atinja para se comunicar, embora muitas pessoas poderiam acabar se sentindo ofendidas dependendo da sua percepção e do seu "senso de humor". Daí a importância de filtrar as mensagens que recebemos e captar apenas aquilo que nos interessa. É assim em geral quando conhecemos pessoas que admiramos muito, mas que em alguns aspectos nos incomodam.

Mas, falando da essência da mensagem contida no vídeo, não entendo muito de filosofia mas lembro de ter tido aula sobre ética e moral na universidade e falavam bastante sobre o pensamento kantiano de que as pessoas seriam capazes de distinguir o “bem” do “mal” com base na moral (me corrijam se eu estiver errada). Mas, a moral não foi baseada na religião para existir? A ideia de que as pessoas, em geral precisariam crer que estão servindo a uma “entidade” superior entra em conflito com a ideia de liberdade e de autonomia do ser humano. Talvez seja por isso que em geral as pessoas fanáticas religiosas tem dificuldades em enxergar a liberdade de escolha como algo bom. Eu posso ser cristã, mas ser a favor da liberdade de orientação sexual, por exemplo. A minha interpretação do que é bom ou ruim é baseada na minha moral individual. É tão difícil achar um equilíbrio. O ser humano é um ser social, e, portanto, nunca é e nunca será "livre" de fato. Está sob influência externa de várias entidades religiosas, da família, dos amigos, da igreja e da sociedade. Então, as pessoas de modo geral sentem dificuldade em serem autênticas e crerem no que elas sentem, na sua intuição e na sua própria moral. A crença enraizada de que somos dependentes da igreja e de líderes religiosos é quem acaba criando robôs que seguem "regras" e "julgam" uns aos outros mas não passam pela reflexão e pela análise moral própria. Se fosse uma crença genuína em Deus não haveria tanta intolerância. O fato de seguir mandamentos ou regras apenas por seguir e sem um propósito íntimo verdadeiro de fé acaba não servindo de nada. Mas será que podemos nos considerar dependentes de Deus e o respeitar como uma entidade superior, mas ao mesmo tempo assumir que muitas das coisas ruins que nos acontecem também dependem dos nossos pensamentos diários e ações individuais, independente de um ente externo? Assumirmos a responsabilidade pelo que criamos ao invés de colocarmos "culpa" no "tinhoso"?

O fato de contribuir de alguma forma para algo em que acreditamos, por mínimo que seja, seria uma forma de nos sentir conectados com nossa essência, e então estarmos conectados com Deus, ao meu ver.

Mas somos falhos sim e muitos agimos por temor a punição, por caprichos, por egoísmos, por não conseguimos perdoar totalmente algumas coisas, por orgulho, por vaidade, para nos proteger. O temor da punição da nossa consciência baseada nas nossas crenças e valores internos que foram enraizados em nós desde crianças acaba direcionando também nossas ações. É muito difícil ser quem não fomos "programados" para ser. É muito difícil desconstruir pensamentos e ter uma visão neutra de tudo.

O palestrante mostra essa aversão a quem usa sua crença ou fé para julgar seus irmãos (e nisso, concordo com ele), mas o fato dele usar ironia e sarcasmo para expor seus pensamentos também não demonstraria uma certa incapacidade em respeitar e compreender outras crenças?

Criticar e satirizar a motivação dessas pessoas e reduzir-lhes chamando-os de “bostinhas”, também não seria uma forma de demonstrar que não evoluímos tanto a ponto de também abraçar a “ignorância” e entender que somos todos influenciados pelo meio?. Podemos usar outras formas de fazê-los compreender? Somos "capacitados" para isso? Usamos a comunicação de forma adequada? Usamos os exemplos na vida real?

Somos rasos em compreender o nível de consciência de muitas pessoas. Abraçar as diferenças seria o ápice da evolução espiritual, mas ao mesmo tempo, precisamos expor o que pensamos e o que sentimos para fazer outras pessoas “pensarem” ou refletirem. Não existe fórmula correta para crer em Deus, mas ao menos estamos tentando. E toda reflexão cria mudanças de realidade lá na frente. Mas é irônico e contraditório pensar que uma referência na área de ética se expresse usando tantos termos chulos. Mas é bom saber que podemos tirar algo bom de tudo o que vemos na internet, apesar de também termos um senso crítico aguçado. Basta enxergar além e abstrairmos aquilo que não nos agrega em nada e guardarmos o que de fato é de valor.

Jaqueline Motter
Enviado por Jaqueline Motter em 01/10/2017
Reeditado em 01/10/2017
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