Aulas de Literatura no tempo da Escola Sem Partido

Estou preocupado com o ensino de Literatura na escola pública:

Quando falar em literatura clássica,

terei de dizer que aquilo não passa

de mito antigo

e que os gregos, graças a Deus,

foram convertidos.

E sobre o texto bíblico:

que não é literatura,

mas dogma divino.

Sobre o Renascimento,

que a Igreja o venceu,

— quanto excremento,

salve-nos Deus!

Louvarei a Companhia de Jesus

no Quinhentismo,

não tocando

no seu ato impositivo:

a aculturação dos índios.

Terei de exaltar, no Barroco,

a contrarreforma,

de maneira banal,

já que foi a acertada forma

de vencer o mal.

Poderei falar sobre Gregório de Matos,

mas só sobre a sua contrição.

Que era o "Boca do Inferno" não!

No tempo do Arcadismo,

direi sobre "Marília de Dirceu",

jamais que o Iluminismo

em si é meio ateu.

Ocultarei, pois, as ideias

antropocêntricas

e direi que são o cão!

Um mundo de maledicências

e de maldição.

Sobre o Romantismo,

somente a primeira fase,

da mulher-mãe e do nacionalismo,

a melhor parte.

Tratarei o índio como

possível branco.

E direi que a segunda fase

é delírio insano.

Com Castro Alves

me condenarão,

ele falava muito

na abolição.

No Realismo,

direi de Machado de Assis

que Capitu, se traiu Bentinho,

agia mal, cheia de ardis.

Falarei muito mais sobre o Parnaso,

por três anos o resgatarei,

porque não fede e não cheira,

e não incomoda a ninguém.

Por ora tratar na escola

de opinião e discussão

é fazer baixaria,

bom mesmo é não tratar a questão.

No Simbolismo direi

que são poemas lunares,

que Cruz e Souza foi pobre e negro,

e sua poesia foi pros ares.

Por fim, sobre os modernos,

não sei bem do que direi,

algo do Lobato, o seu racismo

talvez?

Lima Barreto nunca,

Augusto dos Anjos não mais,

é poesia de mau gosto,

sem requinte, de Satanás.

Oswald e Mario de Andrade,

Murilo Mendes e Manuel Bandeira,

quem sabe se salve um ou outro

poema.

Drummond será difícil tratar

e tudo depois dele,

talvez um escritor menor

que críticas não teve.

Sim, vamos fazer nova história,

vamos tudo reformular,

porque aula de Literatura

como é não se pode dar!