DORME, NENÉM!

Em meio às intrigantes descobertas acerca de sua existência, o ser humano carrega sobre si a eterna fragrância natalícia. Sente necessidade de crescer, atingir a maioridade, a independência, a liberdade que tanto procura e que vem a ele como uma onda terrível em alto mar... e por ser tão interessante o desafio, ele se joga.

Qual a criança que de ímpeto temeu ao choque? À queda? Ao choro? Ao medo? À sua própria sombra? Talvez até ao ver seu rosto refletido no espelho?

Ah, que criança por mais criança que fosse, rejeitaria o xiiiii e a ordenança: -dorme, neném!

Penso que essa expressão descortina as ideologias criadas há muito tempo por nossos antepassados. Talvez é melhor que você não chore, engula o choro, e que você durma, mesmo sem vontade! Sinta-se hipnotizado pois esse é o interesse dos adultos nesse momento.

E quando você atingir a idade adulta, não sairá desse ciclo. Pois para os pais o filho sempre é um bebê e quando você tiver seus filhos repetirá todas essas ações, tentando inibi-lo de quedas e fracassos, de conhecer o mundo, a vida, de arriscar um atalho, porque para você já existe um caminho único que ele deve trilhar sem vacilar, sem erros e passividade de imperfeição. Afinal, esse filho querido é o espelho límpido para a sociedade corrompida. Classificado como o melhor, o ser impecável que não cai e nunca chorou por ter levado um choque na tomada, uma ovelha branca, limpa e preservada.

Nos primeiros dias, o cuidado é triplicado. Um bebê não tem autonomia para nada fazer. Meses depois, começa a comer algo além do leite materno e é onde vai se desligando, em quesito dependência da sua madre. Começa a engatinhar e esse é o grito inicial de independência total, até quando passa a caminhar. Seus primeiros passos, trêmulos, nervosos, receosos da queda que sempre foi recomendado a não vivenciar.

A queda é absolutamente o que um recém-nascido precisa para descobrir que é um ser humano. Nesse momento, sente que tem um corpo, sentimentos, desejos e que nem todos os seus desejos são as melhores opções. Mas ele precisa desejar algo, pois faz parte do seu instinto.

Dentre seus desejos, necessita fazer escolhas selecionando o que é melhor para si. Mas em meio à sua inocência, grande parte dessas seleções o farão sentir-se o pior dos seres, o mais pecador de todos, até o dia em que sentir-se-á moldado, conforme as suas decisões. E por falar em decisões, elas acontecem, na maioria das vezes, quando não temos um mentor humano para nos orientar, deixando assim a autonomia que tanto precisamos e que geralmente aqueles que nos ensinaram o caminho pré-definido rejeitam.

Mediante às escolhas que fazemos, levar um choque, cair, quebrar o braço, quebrar os próprios brinquedos, quebrar objetos preciosos dentro de casa, quebrar a confiança dos pais, são riscos que todos os humanos vivenciam e quem nunca agiu assim, que atire a primeira pedra.

Portanto, deve-se compreender que um dia o sono será profundo, irremediavelmente profundo, e que nesse sono todas as atitudes inocentes ou independentes exigirão uma prestação de contas e que nessa instância, a maior necessidade é acordar para um novo viver.

Taylane Raquiele
Enviado por Taylane Raquiele em 13/02/2016
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