Minha Torneira

No pingo da torneira velha penso na vida. Naqueles pingos da torneira enferrujada do meu rústico jardim, onde eu enterro minhas lástimas dentro das raízes de minhas vistosas árvores, que caladas sempre me ouvem, lembro de pessoas que passaram por minha vida.

Quanta ilusão vivi, quantas vezes desiludi meu coração. Afinal a vida é frágil mesmo assim.

A torneira pinga as dores que tive. A torneira alimenta o mato selvagem do jardim. Alimenta o passarinho que insiste em conversar comigo.

O pingo compassado que escorre até a árvore que cobre, com sua sombra,minha frágil casca cheia de cicatrizes de vidas que lembro se vivi, parece querer chegar à mim, querendo limpar minha aura cheia de corrupção e maldade - mas tem bondade também.

O caminho da límpida água é estreito assim como a porta certa a entrar.

A torneira, cheia de marcas, insiste em jorrar rios em pingos, como se externalizasse muitos e alimentasse poucos. Sento por horas, extasiada pela força da terra que suga meus maus. Há grandeza na natureza. Há alívio nas copas das árvores. Há tristezas nas raízes. Há vida em meus pesamentos.