Uma Carta Para Mim.

Ontem, olhando coisas que escrevi e nunca publiquei, me deparei com um texto escrito em 2012, e que caiu como uma luva para o exato momento em que me encontro. Me atreveria a considerar como "a arte de se presentear", quando penso no que este texto me provocou.

A vida é tão preciosa e passageira. Somos energias materializadas, forças potenciais transformando-se em forças cinéticas, matérias racionais. A vida é tão misteriosa, para perdermos tempo com o que não tem mistério. Eu quero a nova possibilidade, o novo salto e um campo de flores. Não, não percamos tempo com o previsível, com o achado, com o ditado. Sempre há o que encontrar por esse caminho, por essa estrada que também chamamos vida. Essa vida que entra pelos meus poros, que transpira pelo meu punho, que não me deixa descansar. Minha poltrona é-me confortável até o momento em que minha coluna pede um novo movimento. Um movimento que é transformado em calor, que flui e é fluído. Eu já não sou mais eu, sou uma coluna, uma espinha dorsal que não quer perder sua função; a função de manter um corpo em pleno funcionamento. Por quanto tempo eu guardei minha inspiração? Onde ela esteve por tanto tempo? Eu peso minhas mãos sobre os teclados, folheio revistas e tomo um chá. Tenho trabalhos para fazer, tenho livros para terminar, um banho, uma canção, um roupão e um espelho que me agrada. Mas e daí? A vida é isso? A vida é o que afinal? Por que eu estou aqui e não lá? Mas essa não é a pergunta. Talvez a pergunta seja: você se sente feliz, plena, realizada, realizável? Como vai seu apetite que não por um prato de comida? Você sai feliz de casa? Você chega orgulhosa de você em casa? O que você está fazendo? Não, não sou do tipo existencialista e nem me simpatizo por este gênero. Só sinto, às vezes, uma vontade de gritar que está em algum lugar. Tanta coisa presa, reprimida, por sair... eu preciso me desfazer dessas coisas. Já me desfiz de algumas roupas, sapatos, livros, objetos que já não me serviam, ou já serviram a um outro propósito que não aquele que motivou sua aquisição. Agora sinto falta, sinto vontade de despojar-me de minha pessoa. Me jogar em algum lugar desconhecido, fazer algo novo deste corpo-veículo. Fazer algo útil deste corpo-instrumento. O que mais vier, é desejo e realização. Desejo e renúncia, confiança e abismo, aperto de mão, aperto de gatilho, ferocidade, apetite, anseio, provocação. Eu quero sim. Sim!