se querer fosse poder?

Queria eu poder dizer que passei pela vida de alma intacta... Sem gastar solas de sapatos, ou cometer meus enganos, sem diminuir minha identidade ou aumentar meu ego... disposta a ser um canal dos meus sentimentos, sem ações e desejos... Queria acreditar que vim a vida por missões, não só para suprir a incessante ansiedade do dever... andar por entre pedras ásperas, cortantes, e jamais me cortar, pois não haveria marcas ou qualquer sinônimo de dor... Queria eu passar pela vida, sem levar bagagens ou sem acrescenta-las ao passar dos anos... sem adquirir novos medos, sem enfrentar os antigos, ou acumular alguns traumas... realmente inabalável... sem depender da sorte do acaso, da brincadeira do destino, ou da incrível habilidade que o tempo tem de determinar horas e fases... Mas na verdade da verdade, não é assim, passo pela vida em constante mutação. Alguns dias sou adocicada, outros amarga, azeda, salgada,açucarada, sou transparente, turva, escondendo meus próprios estragos, pois dentre os medos alguns como o transparecer me ensurdece a mente inquietante, ora estressante, ora vazia. Lutar pela minha identidade se alterna com lutar para manter meu ego, algo do tipo como enfrentar a definição que se imprimiu no meu ser, marcas, marcas e nada mais... Pois passar pela vida me acrescentou alegrias, felicidades, e a quem devo mentir? feridas, algumas dores, verdadeiras provas de ferro para alguém que já deveria ter como experiência o próprio sentir... é fato, por acaso, passo pela vida ainda insegura do ato de existir... De passagem carrego bagagem, definidas por destinos felizes ou não. Para cada destino desfaço minhas malas, visto minha farda e coloco um tipo de feição ao rosto. Pois na verdade da verdade, de todas as coisas que eu queria da vida uma única ainda espero, não ser apenas meio do meu meio, só por suprir a ansiedade do dever, do querer... Passar pela vida assim, sem ranços, mágoas ou falta de cor... Pois de cinza já basta a dor...