Essa tal de morte

As vezes me pergunto, se essa tal de Morte, com sua foice afiada e imponente, e indumentária preta tradicional, conhecida por nós desde sempre, não deseja se aposentar.

Se pudesse dizer algo a ela, diria que aqui no Brasil, no tocante à idade, as mulheres se aposentam mais cedo que os homens, será que ela toparia as chuteiras pendurar ? Guardar a foice, um feriado qualquer desses, na semana santa por exemplo, seria bom...

Mas não me lembro de ter escolhido nascer. Você se lembra? Não? Então nada mais natural que também não se escolha quando morrer. Se fosse possível escolher, eu creio que muita gente morreria por antecipação...

Temos no ocidente, quanto à morte, uma imagem muito grave desta conhecida idosa. Mas por que será? Há quantos anos, ela nos leva pessoas queridas, uma atrás da outra, sem cessar? As vezes em nossa família, outras na casa do vizinho, do amigo, na praça... Ela não tira férias, licença médica, ou sei lá? Talvez se trocasse sua roupa, vestisse branco, pusesse um óculos escuro e fosse descansar em algum litoral paradisíaco seria menos sagaz, desestressaria... Talvez gostasse tanto que poderia nos brindar com a devolução de Albert Einstein, Newton, Madre Teresa, Gandhi, personalidades tão essenciais quanto brilhantes, a todos que apreciam o mundo com o coração. Quantas maravilhas mais nos teriam ensinado, ou poderiam ensinar ainda. Só que não, seu temperamento imprevisível me faz duvidar que aceite negociações assim.

Tem gente que evita esse assunto, talvez por medo, é compreensível. Mas todos os dias, senão envelhecemos, e caminhamos pra isto, o que temos feito? A esta altura, entre as despedidas que ela traz, a entendo desse jeito: Se se busca a vida, todos os dias, tem gente que morre do mesmo jeito. Então já não sei, o que pensar a esse respeito?. Tem gente que morre, estando vivo, outros morrem um pouco todo dia pra viver. Há os que morrem várias vezes, durante a vida, e há os que em sua morte, ainda vivem, em nosso peito. Não devemos esquecer dos que morrem de amor, uma vez na vida, e há os que morrem, varias vezes ao dia, com uma simples notícia!.

Há os que ainda estão vivos mas já morreram, esses devem dar uma baita dor de cabeça à velha morte, eles tem um pé lá e outro cá. Imagina só viver, esse vacilo louco da vida, existir... Depois morrer, sem saber o que há por vir? Que grave. Viver é tão grave, tanto que pra morrer é preciso apenas estar vivo. Então veja, não sei a quantos anos o ser humano existe, e os outros seres vivos também, mas toda vida que aqui esteve, depois de um tempo, já morreu ou nesse momento caminha pra isso. Mas só isso?, só esperar o dia da morte, isso é inevitável, pra que esperar? cabe a nós fazer acontecer antes que ela chegue, sorrir a beça, chorar emocionado, ajudar um necessitado, de comida, de atenção, de sorrisos ou de exemplos, estou tentando fazer isso, mas ainda não tenho muita experiência. Se serve de consolo, saiba que não estaremos sós. Esse destino é pra todos, um dia. Mas que agonia, por que ainda não acostumamos?

Será se há vida no espaço fora da terra?, se existe, será se a morte atazana por lá também? Será se de lá estão mais perto de Deus? Será se inventaram a imortalidade em algum lugar desse espaço. Quantas duvidas? Visivelmente, a morte incomoda a muita gente, talvez seja por que ela nunca peça licença. Ela simplesmente puxa o fio da tomada e..., game over.

Vida e morte são dois extremos, não queremos morrer, mas alguém deseja ter vida eterna por aqui? Ver familiares nos deixando, arvores definhando, mudanças climáticas, só aqui estando pra ver. A morte pode ate ser um fim misterioso, mas a vida eterna não seria um eterno início sem fim...? Ops!, parece que já estou é dando uma de advogado da morte, então menos pra mim...!

A idosa Morte, com sua foice implacável e aspecto hostil nos faz repensar. Ascende em nós, instantaneamente, um sentimento de pesar. Por que será que dói tanto? Pela incerteza de um depois, ou pela saudade entre um adeus e um talvez? Um "até breve" cai bem, mas faz chorar horrores, eu não recomendo. Acho que a maioria das pessoas é como eu, foi criada e preparada pra viver, e é em em torno disto que estão nossas expectativas, não as de vida, mas de sobrevivência. Somos preparados pra viver indefinidamente, mas não vivemos como se não houvesse o amanhã. Ai que esta o perigo. Viver nesse mundo frenético atual, é viver? Ou uma forma de vida amortecida suave, onde não vivemos plenamente, e quando de fato, morremos, ai selamos completamente um fim que já vinha se arrastando desde o meio?

Cazuza dizia que morrer não dói! eu diria algo mais! diria que morrer é completar a vida, no exato ponto em que ela estiver, estejamos com as bagagens prontas ou não, quer estejamos na "estação" de embarque, ou não... quer tenhamos plantado uma arvore, escrito um livro, ou deixado a nossa semente na terra. E quando ela chegar, não da mais tempo para aquela tão desejada viagem de ferias, adiada varias vezes na nossa agenda mental, nem aquela visita ao amigo doente que nos martelava a cabeça. Esse dia chega pra todos.

Viver é a maior loucura que existe. Reconheça. Que explicação dar? Nenhuma? eu particularmente não tenho uma sequer.

Tem gente, em hospitais, que pede pra morrer, talvez doa menos do que a vida que estejam enfrentando. Isso é tão serio. Quem um dia imaginou-se pedindo pra morrer? justamente morrer, que nos causava tanto mistério, medo, acelerava o coração, e tirava o sono quando éramos crianças.

Desconfio também que a saudade tem um caso com a morte, onde uma está, a outra está por perto. O que você acha?

Não sei nem imagino como deve ser. Se é suave, se é frio, se é rápido. Não vou tagarelar sobre isso, só sei que enquanto ela não chega, é melhor viver bem cada dia, e um dia de cada vez, por que de fato, somos programados e preparados para a vida e raramente para a morte. Então não da pra morrer antes do dia, vamos reagir? São feitos de vida a maior parte das horas e minutos deste tempo em que estamos aqui. O restante, deve permanecer como tal, tudo uma grande e imprevisível surpresa, eis razão por que temos que valorizar nossos dias.

Desejo que possamos ter mais cuidado com a vida, sobretudo, por que a aposentadoria da Morte está bem improvável.Cuide bem de você mesmo, e dos que você ama ou não ama também. Abençoe a quem você não conhece, perdoe quem certo ou errado perdeu o equilíbrio em algum momento. Torne os seus dias mais suaves, de preferência criando o hábito de não agredir-se com vícios, descasos, autoflagelação, ou mesmo a falta de fé. Faça o bem, viva bem, busquemos a consciência tranquila, e deixemos o coração respirar.

Glauco Medeiros
Enviado por Glauco Medeiros em 03/11/2014
Reeditado em 03/11/2014
Código do texto: T5021214
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