Vida Longa Longe do Facebook

Primeiro de Janeiro.

Estou aqui bebendo uma Coca-Cola para aliviar o calor e percebo que ainda são sete horas da noite. O tempo está passando devagar agora... Ontem, tomei uma decisão que muitos considerariam drástica (e pela reação das pessoas para quem contei, elas consideram drástica mesmo). Desativei meu perfil no Facebook. Viu-o desmanchar-se como o gelo do freezer quando o aparelho está desligado.

Minhas razões não são inéditas. Saí, porque tomava muito do meu tempo. Estava me distraindo mais do que deveria. Minha justificativa pode ser rebatida com a indagação: então, por que não apenas diminuir o tempo de uso do Facebook? Não daria certo, pelo menos não comigo. Já tentei me educar antes, já tentei cronometrar o tempo em que ficava online, controlar os dias em que entrava ou o que eu veria, mas a tentação vencia e eu cedia. Embrenhava-me no perfil, nas fotos dos outros, traçando uma retrospectiva mental das suas vidas, admirando mulheres em suas poses especiais para o Facebook, ou simplesmente vigiando o dia-a-dia de interesses amorosos.

Não vou me fazer de vítima. A culpa é minha, da minha curiosidade, do meu interesse. E da minha fraqueza. Se fosse forte, resistiria às possibilidades que o Facebook me oferecia. Como não sou, tomei uma atitude mais definitiva para até mesmo me dar um alerta. Ei, você quer mesmo passar seu tempo aqui, quando a vida está acontecendo lá fora?

O mal está em se contentar com pouco. E eu estava me contentando, por exemplo, com conversas rasteiras no Facebook. Assuntos importantes, conversas que deveriam ser travadas pessoalmente, olho no olho, com as variações acidentais no volume da voz, o nervosismo, as risadas involuntárias, e até mesmo os silêncios constrangidos, estavam sendo resolvidas por pontos brilhantes na tela. Por quadrados que saltavam para chamar a atenção dos olhos. Acabei achando normal tratar certos assuntos por ali, desgostoso da ideia de ter que encarar a outra pessoa, caso ela não ficasse contente com o que eu estava falando. Essa minha covardia, tenho certeza, estimulou quem estava do outro lado a também se esconder atrás dos quadrados saltitantes, dos sons de alerta, dos balõezinhos em vermelho que assomavam da tarja azul. Para ser justo, algumas coisas boas saíram dessas conversas virtuais. Mas, na maior parte do tempo, serviram apenas para que eu ficasse cada vez mais longe das conversas de verdade.

O Facebook me mostrou que nem tudo o que as pessoas têm para dizer é relevante. Comecemos por mim, para fazer justiça. Nem tudo o que digo/penso é bom. Nem tudo o que digo/penso merece ser compartilhado com o mundo. Muito do que digo/penso é, sem meia palavras, medíocre. Me dei conta disso há algum tempo e nos últimos meses de estadia no Facebook, evitei escrever mensagens diárias, fossem elas alegres, indignadas ou provocantes. Toda vez que me surgia uma frase aparentemente interessante de se publicar, eu parava e pensava: "Isso aqui não é uma simples baboseira, não?" E, na maior parte do tempo, era. Lamento que muitas pessoas não exercitem essa mesma avaliação do que vem à cabeça. Se exercitassem, eu não me irritaria ao ver minha linha do tempo, ou Feed de Notícias, repleta de frases óbvias, pretensamente inteligentes, ou reveladoras de uma verdade da qual até então a humanidade não havia se dado conta. Na esteira disso, estão o fenômeno da necessidade de se expor e a necessidade das "curtidas". Me fazem pensar que as pessoas do Facebook ou são exibicionistas (gostam de contar vantagem com aquilo que tem ou com aquilo que fazem) ou tem a auto-estima muito baixa, precisando constantemente de bajuladores.

É sério, não vejo nenhum problema em compartilhar momentos importantes da vida, uma conquista, um feito, a realização de um sonho. O que me incomodava era testemunhar as pessoas compartilhando todos os momentos da vida, sem exceção. Se acordavam, avisavam que tinham acabado de abrir os olhos; se tinham algum compromisso matinal, também faziam questão que os outros soubessem, com frases como "Trabalhar, né", "Partiu médico?". Se iam de carro ou de ônibus (e se o ônibus demorasse), lá iam eles informar, sem dispensar a foto do interior do carro ou do ponto de ônibus. Chegavam ao absurdo de avisar se iriam tomar banho, ou se iriam ao banheiro fazer suas necessidades, ou se iriam, sei lá, fazer qualquer coisa irrelevante e banal que não precisava ser explanada aos quatro ventos. Era a realitishouzização levada ao máximo.

Eu realmente não entendo como uma pessoa pode criar dependência à superexposição da própria vida. Não entendo como isso pode trazer algum prazer. Devo ser, evidentemente, um chato que levou esse negócio de rede social a sério demais. Não quero só reclamar, nem parecer o pedante que largou o Facebook para reafirmar alguma superioridade intelectual. Reconheço que a rede social tem sua utilidade (muitas utilidades, na verdade), e que eu me divertia muito.Me interessava a ponto de ficar horas a fio conversando, vendo fotos de piadas, procurando novidades sobre filmes, livros, música, podcasts, eventos. Muitas vezes, apertei F5 para que o conteúdo da tela se renovasse. Já curti e comentei fotos para me aproximar de quem me atraía e que sensação especial era quando a pessoa não só curtia, como também comentava o que eu tinha dito. Eu tentava não ficar nos elogios mais clichês, mas tem hora que a cabeça não tem paciência para inventar algo diferente. E como é de se esperar, já sucumbi à vontade de querer que os outros achassem a mim e a minha vida mais interessantes, colocando frases e fotos "legais", "divertidas". Para resumir e ser bem sincero, acho que sair não me torna melhor que ninguém.

No fim das contas, para a grande rede, mais uma ausência não vai fazer diferença. Para cada um que sai, deve haver três mil que entram, ávidos pela novidade e pelo desejo de se sentirem parte daquela comunidade. Abro mão das conversas mais discretas, do reencontro com amigos distantes, da aposta de conhecer pessoas de que eu não sou próximo, para investir mais em momentos reais, palpáveis. Não garanto que o desejo de xeretar não vá voltar, mas por enquanto, para 2014, quero que as horas continuem passando devagar, com esse vazio que se abriu, que me dá liberdade de fazer qualquer coisa mais produtiva que me vier a cabeça.

Alex Nunes
Enviado por Alex Nunes em 07/01/2014
Reeditado em 10/06/2014
Código do texto: T4640647
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