Asno no Espelho

A pele do meu queixo escala meu rosto até a testa. Sou esse cara arrimando o queixo nos punhos e os cotovelos numa mesa de madeira, sopesando e repensando tudo quanto foi falha nos relacionamentos amorosos. E é incrível como eu sou altruísta e fico com a culpa de todas elas. Ou é incrível como eu sou burro, e sou mesmo o culpado por tudo que não vingou.

Sou dono dessa mão entremeada à barafunda dos meus cabelos cacheadamente horríveis. Sou dono desses olhos fitos numa porta branca de banheiro. Sou esse homem de oitenta e poucos quilos sentado na privada, que não conquistou bem material nenhum na merda da vida, que encara uma porta branca e repete a si mesmo: eu não sou meu emprego. Eu não sou meu emprego. Eu não sou o maldito do meu emprego.

Sou aquele macaco do videogame, que escala montanhas correndo contra o tempo, que escala montanhas através de uma corda que vai tendo a ponta consumida por uma chama traiçoeira, que escala as malditas montanhas comendo bananas, desviando de bananadas e caindo no abismo, só pra levantar e agarrar na maldita corda novamente.

Eu sou esses olhos que ficam verdes quando ficam vermelhos, e que ficam pequenos quando ficam cheios.

E eu me tornei a merda do meu emprego.

08/05/2012 - 18h18m

Rafael P Abreu
Enviado por Rafael P Abreu em 08/05/2012
Reeditado em 08/05/2012
Código do texto: T3656957
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