Sobre Interpretação de Poesia

Gosto de dialogar com as pessoas e para isso estou aqui. Busco ainda minha voz como escritora. Por isso escrevo aqui. Há algum tempo atrás, fui convidada por um colega daqui do Recanto a fazer-lhe uma visita, ler seus textos e fazer comentários. O convite foi explícito, pelo menos assim o entendi. Vivendo há tanto tempo entre os alemães aprendi a levar tudo a sério – às vezes a sério até demais! - e já que era pra comentar achei que meu colega esperava de mim (no mínimo) um comentário, digamos assim: ‘técnico’.

Bom, no inicio houve um mal-entendido, que Graças a Deus (e à eficácia das técnicas do diálogo) conseguimos resolver. Hoje em dia somos bons colegas e seguimos nos comunicando muito melhor. Porém, dessa experiência tirei algumas lições. E uma delas é não fazer comentários ‘técnicos’ sobre poesia logo nas primeiras interações. E por que não? Para tentar responder a esta pergunta, compartilho aqui um dos emails que troquei com o colega.

“Caro X,

Demorei muito tempo para lhe responder pois quis me dar o tempo necessário para refletir. Refletir sobre a resposta e tantas outras coisas. Eu sou um tipo "devagar-quase-parando", mas já fui também 300 Km/h ou 220 V, o tempo todo ligada na tomada. Isso, com o tempo, quase me matou. Hoje me dou ao luxo de comer mastigando bem devagar antes de engolir, degustando, e dar um passo de cada vez, um após o outro, curtindo o anterior e sonhando com o próximo. Hoje reconheço que, ao tentar interpretar o seu poema (sobre a Tempestade ou a Solidão) cometi um erro. Não foi um erro grave, mas foi um erro. Interpretamos algo para tentar entender, mas em se tratando de arte, poesia, passei a concordar com a Sontag (Susan) que "interpretar significa empobrecer". Caí numa armadilha muito comum: o julgamento precipitado e uma tendência de buscar forma e conteúdo em tudo. Isso se aplica a coisas objetivas, mas não à arte, à poesia. Não pretendo me prolongar além do necessário. Perdoe a petulância e arrogância de eu ter tentado encontrar não ‘uma’ porém ‘a’ interpretação para o seu poema. Ao fazer isso, talvez o tenha inibido em fazer o mesmo com os meus textos, ou os de outrem. Um efeito totalmente desviado daquele inicial: fazer um comentário útil, que ajudasse. Na verdade, estamos todos no mesmo caminho. Não sou tão mais experiente assim para que você me considere melhor ou pior, ou seja lá o que for. O que eu, você e os colegas devemos fazer é continuar escrevendo, escrevendo, escrevendo. E não levar tão a sério assim as possíveis interpretações. Essa sim, é uma forma segura de evoluirmos.

Um abraço fraterno,

Helena.

P.S.: Ah, sentir-me-ia muito feliz se algum dia tivesse a honra que lesse alguns de meus textos, mesmo que não os comente. Quem sabe através deles possa conhecer um pouco mais sobre mim.”

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Como já dito, esse probleminha - que se deu já há muito tempo atrás - foi totalmente superado e hoje em dia eu e o colega em questão trocamos comentários muito mais produtivos. Talvez o mal-entendido inicial tenha sido fruto de um tipo de "choque cultural", ou simplesmente um "problema de comunicação", ou arrogância (fruto de inexperiencia) de minha parte, sei lá... São tantas "interpretações"... De qualquer modo, para mim valeu a lição aprendida! :-)

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NOTAS:

Com ‘comentário técnico’ quero dizer aqueles em que se aponta possíveis erros no emprego da linguagem ou falhas de lógica no discurso, por exemplo. Tipo de coisas que revisores normalmente são pagos para encontrar e corrigir.

Quanto à idéia do Clube da Lupa (1), tão logo tenha tempo – só Deus sabe quando - pretendo voltar a implementá-la.

1 – Para saber o que é o Clube da Lupa leia meu texto ‘Escrever – o que tenho aprendido até aqui’.