Teologia da Prosperidade

 

A teologia da prosperidade não é cristã, pois “quem planta para colher nesta vida já obteve o seu prêmio”. Essa teologia, se assim podemos chamá-la, é veterotestamentária e não tem referência alguma no Novo Testamento, este sim, base fundamental do cristianismo. Os cristãos adotam o Velho Testamento como ponto de partida, berço de sua religiosidade, afinal de contas Jesus era judeu.

 

A doutrina da retribuição, que dá origem à teologia da prosperidade, adotada por algumas ramificações cristãs, surgiu como recompensa ou punição “ainda nessa vida”, fonte de compreensão dos antigos judeus, há muito tempo superada. Essas “seitas” acreditam na benção de Deus sob a forma de sucesso, saúde, êxito econômico-financeiro, progresso ainda nessa vida. Para essa doutrina, quem leva uma vida justa e piedosa receberá de Deus bençãos em forma de prêmios e os que levam uma vida de injustiças e egoísmo receberão as punições por parte de Deus, ainda nessa vida.

 

Essa é uma visão utilitarista e profundamente antropocêntrica. Coloca o homem como centro das atenções, instrumentaliza a fé e compreende que as bençãos de Deus ocorrem de forma material e não espiritual. É um grande erro viver a partir dela e, fatalmente, conduzirá à profundas decepções e questionamentos. Essa visão é fruto da mais completa falta de perspectiva de vida além da morte, oriunda do Antigo Testamento.

 

Mas por que os judeus de “antigamente” pensavam dessa forma ? No Velho Testamento, percebemos profundas reflexões sobre o sentido da nossa existência. Por que estamos aqui, o que fazemos aqui, de onde viemos e para onde iremos ? Essa angústia e ansiedade, que ainda sentimos hoje, era largamente tratada naqueles tempos. Os judeus acreditavam que após a vida, com a morte, todos iriam para o Sheol, não importava se justos ou injustos, bons ou maus, todos terminariam lá. Então, para que ser honesto, solidário, caridoso se todos acabariam da mesma forma ?

 

A interpretação era de que no Sheol todos ficariam aguardando o dia do juízo final, em estado de “letargia”, sem qualquer tipo de relacionamento interpessoal ou com Deus. Um vazio total e profundo. Obviamente, isso provocava medo, aflição e sofrimento, muito sofrimento. Afinal, que futuro poderiam esperar ? Haveria futuro ?

 

Essa visão foi, aos poucos, sendo reformada. Levou bom tempo, talvez séculos, mas percebemos fases embrionárias em alguns livros do AT. Notamos, claramente, um questionamento, por exemplo, já no texto maravilhoso do livro de Jó. Os diálogos com seus amigos, suas reflexões, reclamações e o diálogo com Deus são fantásticos e mostram como essa doutrina da retribuição não se sustentava e nem se sustenta nos dias atuais. Mas o temor a Deus mantinha-se inabalável, pois esse é ponto consolidado na vida dos judeus.

 

Depois do livro de Jó, encontramos uma verdadeira “escadinha” na evolução do pensamento judaico sobre o valor da vida. A reflexão sobre vida além da morte dá os seus passos e abre as portas da esperança para o “povo de Deus”. O livro do Eclesiastes, da mesma forma que Jó, levanta o problema. O “Qohelet” nos conduz para uma forte critica ao conceito da vida ancorado no verbo ter. Há uma boa análise com base na teologia da criação, questionamentos antropológicos e até mesmo uma visão psicológica, além de criticas a ideologia de progresso.

 

 

Posteriormente, temos o livro do Sirácida. Este ainda está na perspectiva do Sheol, ainda vive a doutrina da retribuição nessa vida. Mas dá um pequeno passa à frente, pois reflete sobre o momento da morte, quando Deus, então, dará o prêmio ou a punição em função da vida que cada um teve. Reflete sobre a felicidade eterna, mas na conotação da época e não nossa : felicidade duradoura durante a vida. A tradução grega do Sirácida já levava em conta a meditação da retribuição em outra vida.

 

Finalmente, nos defrontamos com o livro da Sabedoria, passo vital para a derrocada da doutrina da retribuição e para a nova visão e compreensão de que há uma perspectiva de vida além da morte. Este livro trata da doutrina da imortalidade : felicidade sem fim para os justos, mas começando nessa vida. E as pessoas desafortunadas entravam nessa felicidade, eram incluídas na sociedade. Os injustos iriam para o Hades, lugar dos castigos e os castigos surgem a partir da própria consciência.

 

E tudo isso começa em Daniel 12, 1-2 com uma afirmação clara sobre a ressurreição e a vida eterna. No segundo livro de Macabeus, encontramos, no capítulo 7, a fortíssima história dos 7 irmãos macabeus, onde já temos uma crença absoluta na “vida vindoura” como benção divina.

 

Se a teologia da prosperidade, baseada na doutrina da retribuição, tivesse algum alicerce, Jesus teria recebido, em vida, todas as bençãos e graças de Deus. Qual foi a atitude fundamental de Jesus ao longo de sua vida terrestre ? Obedecer integralmente a vontade do Pai ! Ora, e foi justamente o contrário que aconteceu : Jesus foi traído, perseguido, difamado, agredido, torturado e brutalmente assassinado pela crucificação. Jesus jamais se preocupou com bens materiais e dizia que “o reino dele não era desse mundo”.

O seu é ?

 

Ora, que teologia de prosperidade é essa que premia os homens e condena o filho de Deus ? A vida é como uma lavoura : você planta aqui e agora o que irá colher na casa do Pai.

 

 

 

 

Leandro Cunha

Julho de 2.012.

 

Leia : Dt 28 ; Dn 12, 1-2 ; 2Mac 7 .

 

 

Leandro Cunha
Enviado por Leandro Cunha em 09/07/2012
Reeditado em 11/07/2012
Código do texto: T3768167
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