AS TRÊS MARIAS - capítulo 21 - O QUE A MORTE SEPARA, O AMOR REUNE

Vinte e dois anos depois, vamos encontrar as onze crianças (mais algumas se juntaram ao time) já crescidas, bem encaminhadas e, totalmente, dedicadas ao projeto da Casa Assistencial Maria dos Anjos, que então contava com mais três unidades, em bairros carentes.

Seu Alonso se fora há mais de uma década, deixando Cíntia no comando administrativo da entidade, da vinícola e demais bens da família. Ela, com o consentimento de todos os familiares, distribuiu cotas de participação, no patrimônio e lucratividade, para cada uma das pessoas, incluindo os filhos adotivos. Após a cura completa de Hermínia e Norberto, decidiu também estabelecer posto avançado na luta pela liberação da fosfoetanolamina, e a vitória foi alcançada após o quinto ano da campanha de conscientização, em 2018, quando, por fim, o judiciário e governo cederam, diante da inquestionabilidade das inúmeras evidências de cura.

Francine, afetada pelo mal de Alzheimer, já não tinha consciência de si, dos demais e da realidade que a cercava, e por isso mesmo teve de ser assistida todo o tempo. Os sinais da doença começaram a ser notados pouco após o falecimento de seu Alonso, especialmente sentido por ela, vez que o homem a acompanhava e apoiava, incondicionalmente.

Lázaro, que se casara com Cíntia, fazia o atendimento médico das casas assistenciais, e cooptara vários colegas, da área da saúde, para se juntarem ao trabalho voluntário. Berta e Sal também ampliaram os trabalhos artísticos e didáticos, dando origem a um instituto de artes, anexo à primeira casa, que além de visar o desenvolvimento do talento de alunos, também lhes oferecia cursos técnicos convencionais, de acordo com a legislação educacional.

Ingrid e Celeste cuidavam de todo o assistencialismo prático, coordenando doações em alimentos, roupas, materiais de construção e remédios. Até uma farmácia, bem estruturada, foi montada em dois locais, para fornecer medicamentos, gratuitamente ou a preços subsidiados.

A luz de Ana brilhou muitas vezes e em muitas ocasiões, para, praticamente, todos da turma, nas mais variadas situações, nos bons e sofríveis momentos da montanha russa vital que temos de viver da melhor forma possível. Apesar de nunca interferir nas decisões, nos atos e relações dos que lhe eram queridos, a “anjinha” da família esteve presente e orientou os que lhe buscavam em suas orações e pedidos íntimos. Surgia sorridente e se despedia em paz.

Foi numa sexta feira, pela manhã, que Lázaro pediu a Cíntia, que avisasse a todos sobre a piora do estado de saúde de Francine. Sugeriu que a visitassem ainda naquele dia. A romaria não demorou, e logo a área contígua aos seus aposentos estava lotada de familiares, que, porém, não puderam vê-la, por ter sido levada à UTI, pouco antes. Ainda assim permaneceram por ali mesmo, aguardando um prognóstico. Lá dentro, algo mais ocorria.

Francine teve um flash de lucidez e se viu entubada, numa sala escura. Além de todo aquele maquinário, num canto, divisou dois pontos de luz, que se aproximavam. Imaginou que Ana estivesse chegando, mas foi surpreendida com a presença de seu Alonso, também.

- Olá minha querida! Há quanto tempo desejava falar-lhe, pegar em suas mãos.

- Sinto-me zonza, Alonso. Como vim parar aqui? O que aconteceu?

- Você esteve doente, mãe, mas agora vai ficar bem e se juntar a nós.

- Está me dizendo que vou morrer? Vou deixar meu corpo?

- Isso já aconteceu, meu amor. Olhe lá atrás.

Francine se virou e viu seu corpo, já sem vida, estendido na cama. Aparelhos zuniam, anunciando o falecimento, enfermeiras corriam, tentando a ressuscitação, em vão. Ao invés de sentir medo, o que lhe acometia era serenidade, paz, e virando-se para Ana e seu Alonso, só teve ímpeto de sorrir e abraçá-los. Os três caminharam pelo corredor até a sala de espera, onde toda a família estava reunida, e ali se posicionaram ao centro do recinto.

As luzes se apagaram, repentinamente, e diante daquela plateia de entes queridos, três estrelas azuis brilharam, cresceram e desenharam as figuras amadas. Ninguém se mexia ou emitia o menor som. Lázaro chegou nessa hora, triste por ter de dar a notícia do falecimento de sua sogra, e deu com a cena fantástica. O trio então se pronunciou.

- Meus queridos! Desde que me afastei da vida física, não consegui vir vê-los, até hoje, mas de agora em diante estaremos sempre reunidos, pois o amor abre todas as portas.

- Alonso tem razão. Até poucos minutos atrás, eu estava, fisicamente, entre vocês, mas mentalmente alheia a tudo e todos. Agora estou livre,e mesmo que em outra dimensão de vida, presa ao amor que nos une. Os sentimentos são a chave da eternidade para a alma. Até breve!

nuno andrada
Enviado por nuno andrada em 17/07/2016
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