ANINHA DA PRAIA - capítulo 06

Passei a freqüentar com mais assiduidade a casa de minha irmã, e em todas as vezes em que estávamos juntos, fazíamos aqueles passeios fora do corpo físico. Nunca consegui me acostumar, pra valer, com a aventura, mas me deliciava poder voar, não sentir frio ou calor, ter a leveza de uma pluma e os sentidos ampliados. Porém, ao mesmo tempo em que curtia tanta novidade, estava apreensivo por não termos tido, eu e eles, outra conversa mais séria, sobre a origem dos dons que os três apresentavam, conforme havia sido prometido.

Menos de três meses após a primeira experiência descrita, fomos, eu e meus pais, à casa de Ana, para confraternizar com Cirilo, que aniversariava naquele dia, tornando-se um adolescente de dezesseis anos. Não havia festa, porque o casal e o aniversariante preferiam o silêncio e a contemplação, fugindo de qualquer barulho ou agitação; então levamos um pote de frutas secas e sentamos nas almofadas, para bater um papo familiar, bem ameno. Meus pais dormiram ali mesmo, para não ter de voltar à noite para casa, e quando eu ia sair, meu querido sobrinho prendeu minha mão e pediu que o acompanhasse até uma edícula, que ficava bem no fundo do amplo quintal. Nunca entrara lá antes, pois achava que seria um aposento ou dois de despejo, mas quando olhei, me deparei com sala muito ampla, feericamente iluminada, sem que pudesse conceber de onde viria tal luminosidade, que ondulava e fazia os desenhos nas paredes parecerem vivos. Ele notou meu espanto e pediu que ficasse tranqüilo, pois tinha que me mostrar algumas coisas. Essas algumas acabaram se tornando muitas.

Mal havíamos entrado, Ana e Breno surgiram no limiar da porta. Sorridentes, entraram e nos deram as mãos, formando uma ciranda no centro do aposento, que imediatamente passou a se alterar, com as paredes, teto e piso sumindo, dando lugar a uma espécie de bolha, na qual estávamos inseridos, e que vagava, submersa em meio líquido, entre plantas, peixes e outros animais, que logo percebi serem de natureza marinha. Estávamos sob o mar!

Perguntei se estávamos fora do corpo físico, mas Breno disse que não; que aquela era outro tipo de manifestação, capitaneada por Cirilo. A explicação me pasmou mais que a própria aventura, em si. Antes que pudesse fechar a boca, o garoto sorriu e pediu que não surtasse, porque iríamos descer em velocidade, ao longo de uma fossa submarina; e sem que eu tivesse tempo de me preparar, a queda se iniciou, tornando-nos sem peso e trazendo meu coração até minha boca. Não tenho a menor idéia de quanto caímos ou a que velocidade, mas sei que foi rápido, suficientemente rápido para que eu não tivesse tempo de ter um piripaque. É claro que mesmo depois de algum tempo, meu coração parecia que ia sair do peito, de tanto e tão alto que palpitava, mas ficou mais agitado ainda, quando vi que em volta da bolha, até onde a vista alcançava, se estendia uma verdadeira cidade submarina, ou algo que o valha, porque aquelas construções nada tinham em comum com tudo que conhecera até então.

Perguntei onde estávamos e o que significava tudo aquilo.

Ato contínuo, Ana e Breno saíram da bolha e seguiram pelo meio aquático, sumindo entre as edificações. Pareciam não ter qualquer dificuldade naquele ambiente.

- Eles estão em seu ambiente tio Gab (meu apelido). Você sempre achou estranho que ambos não tivessem uma origem definida, bem conhecida; e agora sabe que vieram bem deste lugar. Não são, exatamente, humanos como o povo da superfície, mas também não estão tão distantes da natureza deles. Aqui nestas profundezas subaquáticas vive parte de seu povo, que decidiu estabelecer uma base neste planeta, para estudar e auxiliar a humanidade, sem interferir em seu livre arbítrio. Sei que lhe parece absurdo falar sobre alienígenas, civilização submersa, gente estranha, mas estou sendo fiel à verdade, e preciso lhe dizer estas coisas, para poder explicar outras, mais importantes, que dizem respeito a nós, ou seja, eu, você e mais outras pessoas. Peço-lhe que me ouça, tentando entender, para seguirmos adiante.

Eu não tinha o que dizer. A impressão que imperava na mente, era a de que estava em algum lugar, adormecido, e que aquilo tudo era um sonho louco, do qual despertaria a seguir. Meu sobrinho, no entanto, estava decidido a me por a par de todo aquele aparente absurdo, e tive de acompanhar, com dificuldade, o desenrolar de seus relatos, que abrangiam a descrição do planeta de origem daquele povo, seu enorme desenvolvimento e suas boas intenções. Ao terminar de descrevê-los, silenciou, pois a sequência da narrativa tinha ele como protagonista.

nuno andrada
Enviado por nuno andrada em 17/08/2015
Reeditado em 02/09/2015
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