Rabiscando

O poeta não vive sem palavras

Ele é refém ou faz delas suas escravas?

Palavras... ele as suplica

Nem ele mesmo as explica!

Poeta sofre preconceito

Porque arranca do peito

Sua intensa verdade

Por isso, mascará-la também sabe

Reprime seu suplício

As ânsias o levam ao hospício

As palavras trazem desengano

É muito sentimento para um ser humano

O poeta tem um mapa

E não calcula aonde vai chegar

Percorre estradas, luta, escapa

Sem sair do lugar

Ele chora em palavras doces

Coloca aroma nas flores

Inventa um mundo sem dores

E, sendo só, cria grandes amores

Poeta é incansável sonhador

Ludibria, joga, fascina

Faz dos versos sua sina

E dá lições como professor

Aparentemente, não faz mal a ninguém

Amizade ele diz que tem

Afinal, ele sofre por quem?

E, no final, ele ganha algum bem?

Escreve e descreve sem cessar

Pega o papel e rabisca seu versar

Parece que tudo o que tem para falar

É incompleto... precisa continuar

Reticências, para ele, é um modo de seguir

Imagina em três pontos como pode desenhar

As coisas do seu pensamento que estão a explodir

Pontos podem ser pérolas dentro do mar

Poeta é um sujeito tinhoso

Pode ser um tanto perigoso

É verdadeiro com rosto mentiroso

Mas extremamente amoroso

Vai do insano ao puro - dual

Por vezes, tão imoral

Vai do casto ao sensual

Até diria que é normal

Se a palavra para ele some

Seu coração é maculado

A angústia lhe consome

Perder um verso é um pecado

Se uma palavra lhe causa impacto

Mais o impele a devoção

Não pretende ser estático

Venha o que vier na inspiração

Poeta é sem pudor

Ele se faz de inocente para "passar bem"

Responde a si mesmo - desafiador

Desconfio que é do amor que ele é refém