Brigadeiro a Flores - Cap. 36: Celular

Após alguns minutos, Benício se afastou. "Me desculpa, eu tenho tentado ficar bem, demonstrar alegria na frente das pessoas, mas quando fico sozinho, à noite, não consigo me conter." Ele disse limpando as lágrimas e olhando para o mar.

"Tem a ver com sua viagem à África?" Erva perguntou.

"Eu sou um idiota, Erva. Apenas isso".

"Não fale desse jeito! Você não é nada idiota, você só está sensível e é normal isso".

Benício a olhou e soltou um sorriso sem mostrar os dentes. "Sophie estava certa ao dizer várias vezes que você é incrível!"

Erva ficou em silêncio.

Benício respirou fundo e olhou para o céu estrelado. "Eu encontrei com Sophie ainda no aeroporto, ela ficou feliz em me ver. Os primeiros dias foram incríveis. Nós parecíamos um casal. Saímos juntos, arrumamos o apartamento, fizemos compra, cozinhamos. Ficamos juntos em todos os momentos, não tinha momento ruim para namorarmos."

Eles ficaram juntos. O coração de Erva doeu ouvindo aquilo tudo.

"Mas... Sophie começou a trabalhar e fazer trabalhos voluntários. Ela ficou muito ocupada e não tinha mais tanto tempo livre. A gente mal se via. Ela saia muito cedo, e voltava muito tarde. À princípio eu fiquei acordado, mas então, não importava mais eu ficar acordado ou não, pois ela só queria tomar banho e dormir, nem comer, comia comigo mais."

"Vocês foram se separando".

"Sim. E eu fui me sentindo um inútil. Eu lembrei muito do que você disse para o Bernardo quando o chutou." Benício sorriu dolorosamente, Erva se lembrou das palavras. "Você disse que ele não era nada se não fosse o dinheiro da família dele e que ele não sabia a dor e o esforço que é para conseguir algo. De certa forma, todos nós somos como o Bernardo."

"Ah, você não é as..."

"Sim. Eu também sou." Benício falou abaixando a cabeça. "E eu senti muito isso na África. É uma realidade bem diferente da nossa".

"Sim".

"Eu tentei me voluntariar em alguns lugares para poder ocupar o tempo e viver o que Sophie estava vivendo mas... já era tarde para mim."

"Como assim?"

"Não cabe falar agora, é só que nós começamos a discutir e sempre nos resolvíamos, mas isso desgastou. Um dia, eu dei um cheque nela e a resposta não foi o que queria".

"Ela te recusou?"

"Ela disse que só me via como um amigo. Que nesses dias que ficamos juntos foi bom, mas não era algo que ela queria para a vida dela. Que ela não conseguia me ver como homem, mas sim como um amigo querido. Ela só me amava assim". Benício deixou algumas lágrimas caírem. "Aquilo doeu de uma forma que... no dia seguinte, eu fui embora assim que ela saiu pra trabalhar."

"Entendi."

"Eu achei que deveria mudar meu jeito." Ele disse e Erva percebeu mais ainda a dor em sua fala. "É o que dizem, quando a gente leva um fora da pessoa que amamos, a gente muda, não é?" Ele forçou um sorriso para Erva. Ela continuou séria. "Foi por isso que resolvi ser como qualquer pessoa. Não me importar mesmo para nada. Parar de pensar em sentimentos, aproveitar a vida."

"Mas você não é feliz." Erva disse olhando com tristeza para o garoto, ele fechou o sorriso forçado e a olhou sério. "Desde que eu te conheci você fala que não se importa com os outros. Mas você sempre se importou comigo. Sempre me ajudou." Erva disse com um sorriso e então olhou para o mar. "Minha teoria é que você se importa demais com as pessoas, mas diz que não se importa para não mostrar seus sentimentos . Quer dizer, você não é galanteador com as meninas, porque sabe que não podem correspondê-las caso elas se apaixonem por você. Para não machucá-las e dizer não, você as mantêm longe e sempre explica porque está tendo um gesto de gentileza, caso faça algo. Para elas não o interpretarem errado." Erva disse lembrando-se de quando ele a salvou e disse as mesmas frases. "Você não é como os meninos. Você se preocupa com suas ações em relação aos outros e por isso é único do seu jeito." Erva olhou Benício e ele tinha os olhos brilhante e sorriu. Eles ficaram se olhando por um tempo. Como ele está lindo assim sob a luz da lua.

Benício então colocou uma mexa do cabelo de Erva que estava sobre seu rosto atrás da orelha dela e se aproximou mais da garota. "Você é única também, Erva". Sussurrou.

O coração de Erva bateu mais rápido, ela fechou os olhos quando o garoto se aproximou mais de seu rosto para beijá-la. Benício!

Zum-zum. Zum-zum. Algo dentro da blusa de Erva começou a vibrar, o garoto parou o que iria fazer e Erva abriu os olhos. Zum-zum. Zum-zum. "Acho que tem algo vibrando aí".

"Ah sim. É o celular". Erva pegou o celular que estava em um bolso de sua blusa. Ligação de Bernardo. "Ah, é o Bernardo". Erva ficou olhando a tela.

"Huuum não vai atender?"

"Ah, eu... deixa quieto." Erva colocou o celular novamente no bolso.

"Deve ser importante, ele não é de ligar para as pessoas." Benício disse voltando a olhar o mar.

"Ah, bom..." Erva estava desconsertada. A gente ia se beijar? "Eu acho melhor eu ir. Você vai ficar bem?"

"Sim, você já me ajudou muito! Mais do que imagina". Ele a olhou com um olhar mais feliz do que quando ela chegara.

"Certo! Me avise qualquer coisa. Eu... eu estou aqui por você". Ela disse o olhando docemente e então se levantou. Meio boba, tropeçou antes de sair e Benício sorriu mais um pouco, ela, sem graça, saiu correndo.

Droga! Nós íamos mesmo nos beijar? Eu... ela colocou a mão no coração, e sorriu. Eu queria isso. Que nos beijássemos. Ele... aaah Benício. Eu queria!

Ela foi pensando enquanto andava até a casa, onde encontrou o Bernardo na entrada. "Onde você estava?" Ele perguntou.

"Ah... desculpa, eu estava dando um volta e..."

"Por que não avisou?" Ele disse bravo.

"Hã? Avisar?"

"Claro, eu estava preocupado." Ele tinha uma ruga na testa, nervoso.

"Oxi, por quê?"

"Porque sim, idiota!" Ele bufou. "Eu levantei para ir ao banheiro e não te vi na cama, daí mandei mensagem e você não respondia, olhei a casa e você não estava. Achei que tinha ido para o mar, tomar um banho, e tinha se afogado. Faz uns 30/40 min que estou te procurando. Tentei contato e nada".

Nossa, ele estava preocupado mesmo. Acho que nunca alguém se preocupou tanto quanto ele se preocupa. Deixa eu ver as mensagens... huuum, cadê meu celular?

"Entendi, acho que..."

"Enfim, não saia mais assim está bem?" Ele disse a puxando para um abraço inesperado. "Fico feliz que está bem!"

"Huuum Bernardo...."

Ele a soltou, mas colocou o braço ao seu redor, a acompanhando para dentro. "Agora vamos dormir".

"Espere... Bernardo, você não precisa se preocupar."

"Mas eu me preocupo." Ele disse a olhando ternamente. "É mais forte que eu." Ele se aproximou do rosto dela, querendo beijá-la, mas ela desviou. Ele ficou a olhando. "Eu disse que gosto de você, e por mais que você não acredite, é verdade."

"Bernardo, aquele beijo... huuum, eu me deixei levar pelo momento e..."

"Eu vou te esperar!" Ele a interrompeu. "Olha, eu sei que você não me deu uma resposta ainda, e disse todas aquelas coisas, mas eu... eu fico bem em só te ter ao meu lado por enquanto." Ele falou com um sorriso e Erva ficou o olhando surpresa. "Eu vou esperar pela sua resposta enquanto a gente se conhece. Então, está tudo bem."

"Eu..." Eu já tenho minha resposta. Ela pensou mas não disse.

"Vem, vamos dormir. Estou bem cansado ainda, amanhã vamos aproveitar a praia." Ele a levou para dentro.

No dia seguinte, Erva ainda estava pensativa sobre o que ocorreu na noite anterior, ela e Benício quase se beijaram e Bernardo a surpreendeu com seu jeito de ser.

Nunca alguém foi tão preocupado comigo. E ele falou em esperar minha resposta. Eu já tenho minha resposta. E é não. Ele não pode gostar de mim. Nós não temos nada a ver, mas então por que eu não disse? Por que eu fico sem reação e surpresa quando ele age assim? Ela olhou para o garoto que estava na sua frente fazendo um prato com o buffet de café da manhã. Olhando assim, ele é até fofo.

Bernardo se virou para ela e Erva corou, ele colocou alguns pães diferentes no prato dela.

"Pronto, experimente todos esses e coma o quanto quiser. Não quero ver você passar fome!" Disse. "E por que está vermelha?"

"Ah... nada". Erva disse disfarçando. "Eu não preciso de tudo isso. E eu não vou passar fome."

"Não sei. Você nunca deve ter comido essas coisas por ser pobre. E eu já vi você almoçando, seus pratos são enormes, então aproveite".

"Besta!" Erva disse com raiva, tirando os pães de seu prato. "Eu como muito porque é minha única refeição forte do dia. E isso não tem nada a ver sobre eu ser pobre. E pare de me chamar de pobre". Esquece, ele não é fofo. Ela saiu de perto e ele riu, voltando a fazer um prato com várias coisas para ela.

Após o café, que Erva saiu rolando de tão cheia (após comer o que Bernardo trouxe e mais um pouco), o grupo foi até a praia. Erva teve medo de entrar na água porque não sabia nadar e havia ondas, mas Bernardo a pegou no colo.

"Idiota, me solta!" Ela gritou e o grupo deu risada por ela espernear. Todos seguiram para o mar.

"Não!"

"Não Bernardo, eu não sei nadar. Aaaaah tá gelada". Ela disse enquanto a água espirrava em seu corpo, após ele entrar com ela e avançar para dentro.

"Dá pé aqui, eu vou te soltar". Ele soltou Erva com delicadeza enquanto dizia, ela então sentiu a areia. A altura da água dava em seu peito.

"Minha nossa!" Ela disse sorrindo, depois jogou água no garoto. "Besta! Não faz mais isso."

"Você ia ser a única a ficar na areia. Não teria graça." Ele falou se justificando e Erva sorriu.

"Ok, obrigada!" Ela disse firme.

"Aaah você sabe agradecer!" Ele sorriu e ela o olhou cerrando os olhos. "Vem, o pessoal está jogando vôlei, vamos lá jogar também."

"Eu tenho medo, e se vier uma onda forte?"

"Não se preocupe, eu conheço aqui, não vamos ter ondas fortes. E vamos ficar só onde dá pé para você, ok?"

"Você não quer ir nadar mais para o fundo?"

"Depois, enquanto você estiver na água ficarei ao seu lado, tudo certo? Não precisa ter medo, eu te salvo". Ele falou sorrindo e deu uma piscadinha para ela. Erva sentiu seu coração quentinho.

"Pera, me salva? Não é para me salvar Bernardo, é para NADA acontecer". Ela disse e ele deu risada e mergulhou para se molhar por inteiro.

Os dois foram para mais perto do grupo e começaram a jogar vôlei com eles.

Erva reparou que Benício não estava, e a menina de cabelo roxo disse que ele iria levantar tarde, pois saiu a noite e voltou quando o sol nasceu. Ele ficou mais tempo na praia então. Erva pensou.

A manhã foi agradável e Erva se divertiu muito com os grupo. Mesmo as discussões bobas com Bernardo, como quando ele a pegou de cavalinho de surpresa e saiu correndo com ela pela areia, tropeçou e os dois caíram, a arranhando um pouco no braço e ela o xingando pela imprudência, foi divertido.

"Você ficou se debatendo, eu não consegui me equilibrar. A culpa é sua". Disse quando voltaram e sorrindo.

"Minha culpa? Você é besta e me colocou em suas costas." Ela disse e todos riram. "Você sempre faz o que bem entende, sem me perguntar e depois coloca a culpa em mim!"

"Carlos disse que eu não te aguentava".

"Não me aguentava?" Erva olhou para o loiro e enrugou a testa.

"Eu disse que você não era tão pesada assim". Continuou Bernardo.

"Pesada?"

"E Fagundes apostou 1000 reais".

"Apostou?" Erva olhou para o ruivo que deu de ombros.

"Eu disse que faria de graça!" Bernardo disse fazendo pose e mostrando seu bíceps, se achando para Erva. Ela pegou uma almofada que viu e jogou nele.

"Idiota! Eu não sou pesada e não faça apostas comigo envolvida para ficar se mostrando por aí! Eu vou tomar banho!!" Erva subiu as escadas rapidamente.

Bernardo riu. Eu amo esse jeito dela. E se sentou no sofá, sorrindo.

"Vamos aproveitar e tomar banho também". Carlos falou para sua garota. Fagundes fez o mesmo e os quatro foram em direção a escada.

"Acordou a bela adormecida". Fagundes disse ao avistar Benício descendo.

"Desculpa por hoje de manhã gente, quis ver o nascer do sol." Mentiu.

"Devia ter me chamado, seria tão romântico". A garota de cabelo roxo se aproximou e ele apenas sorriu, se desviando dela. Ela desmanchou o sorriso largo que tinha dado, ficando sem graça.

"Eu vi vocês falando de banho. Vou comer algo enquanto isso".

"Certo! Mas não esquece que tem almoço daqui a pouco". Carlos falou e os cinco subiram.

"Você não vai tomar banho?" Benício perguntou a Bernardo que ficou na sala.

"Não, vou para piscina um pouco." Bernardo disse ainda sorrindo. Melhor esperar Erva tomar banho e se arrumar para depois ir ao quarto.

"Entendi." Benício disse se dirigindo para a cozinha, mas parou no caminho. "Ah já estava me esquecendo. Pegue." O garoto entregou um celular para Bernardo, que reconheceu e enrugou a testa sem entender. "Erva deixou cair ontem à noite na praia. Guardei para ela, mas ainda não a vi." Explicou.

"Você estava com ela ontem à noite?"

"Sim, ficamos conversando e olhando o mar por um tempão."

Ela disse que estava caminhando na praia, mas não me disse que estava com ele. Bernardo pensou enciumado.

"Vou comer!" Benício foi em direção a cozinha.

Bernardo levantou bravo e foi em direção a escada para poder ir ao quarto, mas se segurou. Não, eu falo com ela depois. Não adianta chegar irritado. Vou nadar! Preciso me acalmar. Ele saiu em direção a área da piscina.