[Original] Ela me faz - Capítulo 14 - Parte 3

Capítulo 14 – Entre vômitos e verdades – Parte III

Minha visão turva já me fazia ver dois copos na mesa. E de tão tonta, não conseguia nem me levantar. Imediatamente me arrependi de ter virado meia garrafa de vodka sozinha. Não tenho estrutura para beber. O garçom, parecendo ver o meu estado, se aproximou de mim.

- Você tá muito bêbada. Não tem ninguém para vir te buscar não?

- Bêbada eu? Eu estou ótima! E não preciso de ninguém não, obrigada pela preocupação. – Respondi, apoiando-me sob a mesma para poder ficar em pé. Senti um olhar queimando as minhas costas e resolvi ver quem era. Um homem bonito de aparentemente 30 anos me olhava, assim como o garçom, preocupado. Respirei fundo e voltei a olhar pro garçom. – Acerta a minha conta, vou embora.

- Ok! Só um momento. – Ele disse, indo em direção ao caixa e voltando quase no mesmo tempo com uma comanda. – Aqui.

Olhei os valores.

- Tudo isso?

- Aham.

- Que absurdo.

Paguei para o garçom, que ainda me olhava, preocupado. Saí do bar em passos tortos, e não sei se é porque estou assim, mas de repente me deu muito calor. Marchei desorientada de volta para a festa, quando o homem do bar me alcança e andamos lado a lado.

- Posso te dar uma carona?

- Não, obrigada. – Apressei o passo, mas ele se manteve ao meu lado. – Olha, de verdade, hoje não tem sido um bom dia, se você for me estuprar, avisa pra eu pelo menos ter a dignidade de sair correndo.

E ele riu. Surpreendentemente riu e foi uma risada que me fez rir também.

- Não vou fazer nada contigo. Meu nome é Alexandre, e qual é o seu? – Arqueei a sobrancelha. – Tudo bem, vou te ajudar a chegar no seu destino, se até lá você não confiar em mim, fico sem saber o seu nome.

- Tá bom.

E seguimos andando. Quer dizer, ele andando e eu forçando a andar corretamente. O que por um tempo deu certo, mas não durou muito. Eu só não caí no meio da rua graças ao estranho-protetor que me segurou com muita agilidade.

- Você não está conseguindo nem andar... – Murmurou, me segurando pelos ombros. – Pra você beber vodka assim é porque a coisa foi séria.

- Você não tem noção do quanto.

E como se a noite não tivesse sido estranha o bastante, Alexandre resolveu me levar no colo. E o mais ridículo disso tudo é que eu comecei a me abrir com ele, sabe? Contei do motivo de eu estar num bar a 1h00 da manhã. Falei de Lucas e do quanto era difícil gostar dele e não ficar com ele. Também confessei que cheguei chorando porque Conrado estava certo. “Quem é Conrado?” – Ele questionou, em meio ao meu desabafo. “Meu ex-namorado que me ama, mas também me odeia.” – Respondi e voltei a falar, e falei, falei, falei até cair no sono.

- Não dorme não!! – Pediu, me chacoalhando.

Eu só abri os olhos porque um enjoo imenso me subiu pelo estômago.

“Vou vomitar. Vou vomitar. Não posso vomitar em cima de um gato desse.” Me debati em seus braços como um animal furioso e corri para o mato mais próximo que encontrei.

O alívio que me deu foi tão grande que até sorri. Uma pena a tontura ter continuado. Acho que isso é um castigo pra eu entender que não sirvo para beber.

- Melhor? – Alexandre perguntou, se aproximando e estendendo a mão.

- Sim, muito. – Respondi, limpando a boca. O bom disso é que não rolou nenhum clima entre a gente, pois me ver vomitando com certeza quebrou o encanto de tudo.

Voltamos a andar pelas ruas quando ouvi meu nome duas vezes. Parei e procurei visualmente pelas vozes, mas não encontrei.

- O que foi? – Perguntou Alexandre, parando também.

- Estou ouvindo alguém me chamar.

Alexandre franziu o cenho, confuso. Ou me achando louca. O que também é aceitável. As vozes foram se aproximando ainda mais, até que consegui distingui-las.

- Dá tempo de cavar um buraco e sumir? – Perguntei ao homem do meu lado. – Essa Rafaela que estão gritando sou eu.

- Sério?

- Sim.

As vozes foram tomando forma, corpo e realidade até que então Iasmin e Lucas pararam numa distância considerável e me olharam com uma preocupada sinceridade.

- Rafa, onde você estava? – Ela perguntou, se aproximando, mas eu recuei na mesma hora e mantive meu olhar fixo em Lucas. – Amiga, você está bem?

- Pelo jeito está ótima. – Ele murmurou, cruzando os braços e me olhando de forma acusadora.

- Não cara, se vocês tivessem chegado há alguns minutos atrás veriam a garota vomitando até o que não tinha. – Alexandre disse, com toda a sinceridade e honestidade de quem não tinha conhecimento algum sobre a minha vida.

- E quem es tu? – Lucas retrucou.

- Quem ele é não te importa. – Eu revidei e ele me olhou estranhando a dureza em minhas palavras. – Vamos embora, eu estou enjoada.

Ameacei dar um passo para ir embora, mas Lucas criou uma barreira em minha frente. Seu olhar encontrou o meu e me controlei para pensar em qualquer coisa que não fosse o quanto ele ficava irresistivelmente lindo quando irritado.

- Espera aí. Eu estava preocupado contigo e é dessa forma que tu me tratas?

- Ah!!! Agora você também vai me dar uma de vítima? Logo você que é o maior culpado de tudo?

- Bah, que mania de me culpar por tudo guria!

- Lucas... – Iasmin se pôs entre a gente, mas dessa vez a briga era somente nossa.

Eu tinha que falar. E dessa vez era a minha vez de falar.

- Sim, a culpa é sua! Por que foi você, desde o passado que me provocou a ter essa... Isso... Essa droga de sentimento que eu tenho! E agora eu tenho que admitir em voz alta que eu já te amava quando você ainda era somente um garoto idiota que me forçou a te beijar na sala da sua casa. E eu juro que tentei resistir, fugir, mas não teve jeito, você deu um jeito de vir pra cá e ainda por cima chegou numa época horrível. – Fitei Alexandre, que assistia a tudo em silêncio. – Você já foi corno, Alexandre? Dói, não dói?

- Dói muito. – Respondeu ele, sorrindo tristemente.

- Eu fui corna e depois tive que lidar com você. – Agora eu falava olhando para Lucas e me surpreendi por estar conseguindo falar tudo com firmeza. - E com o que eu achei que tinha sumido, mas bastou te olhar e eu vi que o que eu achei sentir não era coisa da minha cabeça.

Claro que eu não queria aceitar o sentimento. Eu nunca aceito as coisas direito... Até o dia que você fez merda, Lucas. Você sempre faz merda. Principalmente quando age como se eu fosse um objeto que você tem quando bem quer... Como disse pros seus amigos do Amália.

Eu respirei fundo, tentando recuperar o ar e o equilíbrio após ter desabafado. A expressão de Lucas era de culpa e vergonha. Ele finalmente tinha entendido todas as minhas ações e o porquê delas.

- Então era isso... – Falou ele, depois de um longo tempo em silêncio. – Foi por isso que tu não aceitaste meu pedido de namoro.

- Sim. Eu não podia namorar com alguém que não confiava.

- Bah, quer dizer que tu preferiu guardar tudo pra ti ao invés de me falar algo que poderíamos ter resolvido como gente grande?

Sério mesmo que ele tá se fazendo de indignado? Qual é o problema desses homens?

- Resolvido como gente grande? Você fala pros seus amigos que me tem quando quer, que eu sou assim porque faço charme contigo e a errada da história sou eu?

- SEMPRE ISSO! – Ele gritou. Sim, gritou. Um grito do tamanho de sua fúria. Iasmin ainda estava entre nós dois. – Porra, tu só sabe apontar os erros dos outros, falar e repetir. Tá dizendo que estou me fazendo de vítima, mas olha para ti, Rafaela! Sempre procurando um problema pra fugir de qualquer coisa que possa te fazer feliz. A culpa não é minha! A culpa na verdade é sua e desse teu jeito de agir. De sempre esperar que algo dê errado para então culpar a todos.

- Olha... – Eu tentei falar, mas fui impedida.

- Não precisa dizer nada, Rafaela. Tu vais agir como se a culpa fosse minha e do universo conspirando contra ti. Eu admito o meu erro, mas não vou aceitar novamente que você me culpe.

E Lucas saiu marchando com passos pesados, as costas subindo e descendo num ritmo acelerado. Até que desapareceu na escuridão da rua.

- Iasmin, amanhã eu vou pra casa... Não estou com cabeça para dormir na mesma casa que esse garoto.

Ela me olhou daquele jeitinho Iasmin de ser, como quem compreendia o que é incompreensível e me deu um abraço longo.

- Eu sempre vou estar contigo. Até quando você não merecer.

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 12/06/2014
Reeditado em 26/06/2022
Código do texto: T4841830
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.