Os Cavaleiros - parte 1
Cap 01 – Contestação
Sou Nisa Benthon, uma alien do planeta Irids. Fui criada aqui na Terra por um humano professor universitário. Possuo poderes telepáticos, empáticos e telecineticos. Sempre estou em metamorfose, mudando cores e formato de cabelos, unhas e corpo. Atualmente sou uma baixinha de 1,50, ruiva escarlate de longas madeixas que cobrem a cintura. Ganho dinheiro no mundo artístico, produzindo músicos, compondo e coreografando.
Tudo começa com uma viagem feita por simples curiosidade e vontade de contestar tudo o que diziam sobre a Grécia.
Muitas historias de cavaleiros eram conhecidas graças aos contos medievais como a demanda do Santo Graal. Eu sempre lia sobre o assunto, mas, naquele ultimo mês, havia fuçado em toda e qualquer literatura mundial que retratasse mais profundamente o perfil de um cavaleiro leal a uma coroa ou a um “rei”.
E mesmo os relatos mais superficiais desses cavaleiros eu achava muito tristes e desumanos. As narrativas eram repetitivas e quase sempre tinham o mesmo fim. Eu queria ver algo diferente. Sentir algo real daquelas narrativas.
Eu havia lido algumas histórias humanas fantásticas relativamente novas, contadas por fanáticos sobre pessoas que praticavam alguns tipos de lutas acima das capacidades humanas. Também tinha lido análises físicas de esportistas e mestres em artes marciais as quais falavam de alguns poucos escolhidos que ficavam de guarda de um certo local na Grécia. Vi varias apresentações acadêmicas feitas por estudiosos de Educação Física e Literatura a procura de algumas respostas para minhas perguntas mais primordiais. Nada me convencia de que tudo aquilo que eu havia lido era fruto de uma mente fértil sobre o tema “guardiões” ou “cavaleiros zodiacais” (termo que muitos usavam).
Eu não acreditava em metade das histórias que ouvia, apesar de ser extremamente e fisiologicamente diferente de todos. Mas mesmo assim, havia pessoas no âmbito acadêmico e social que acreditavam ainda na existência de cavaleiros da era moderna. Ao meu ver, eram pessoas que morrem e lutam por razões e motivos que não são deles. Eles treinam, vivem e morrem por uma ideologia que ainda não estava clara em minha mente.
As descrições dos homens capazes de manipular golpes em velocidades acima da velocidade da luz ainda eram surreais para mim. Seriam estas “pessoas” capazes de fazer essas coisas seres também de outros planetas?
Em meio a tantas perguntas, tantos textos, tantas pesquisas eu decidi viajar para provar positivamente ou negativamente se tudo aquilo que eu lera e ouvira a respeito era besteira.
O destino da viagem era claro como água: Grécia. Com direito a visita nos locais turísticos, pesquisas em universidades, bares e todo o âmbito de diversões, claro.
Muitos riram ao saber o motivo e a localidade para onde eu iria. Para muitas mentes fechadas, existiram apenas cavaleiros na Europa, e ainda estavam presos na imaginação coletiva na era medieval.
Minha busca era mais diferente, eu queria saber se existiam outros tipos de cavaleiros, o que faziam e para quem serviam. Acima de tudo, queria saber se tínhamos semelhanças. Eu sabia que estas respostas não seriam encontradas em locais comuns.
O objeto da minha análise: a vida quotidiana dos moradores de um determinado local, o tal Santuário Grego que ficava em Athenas.
Para conseguir o financiamento da viagem foi uma imensa briga... uma vez que eu não iria apenas como curiosa, mas sim como estudiosa. Fizemos apresentações de projetos para os países em que tínhamos que viajar, declarações de estadia, assinaturas de não intervenção na cultura local (pra que serve isso mesmo??? Ah sim... deve ser porque eu adoro mudar o mundo!).
Nada que meu grupo jurídico não conseguisse em horas, ou que minhas habilidades “extras” não alcançassem em segundos.
Viajamos para Grécia em menos de 2 dias de preparação, me hospedei no próprio santuário, graças a farta diplomacia mundial da qual eu me gabava ter.
Não precisei passar mais do que minutos andando entre os transeuntes para notar a clara pirâmide social local: uma pessoa apenas era tratada como um “mestre” superior de uma equipe de cavaleiros. Um homem comandava uma cadência de outros com habilidades diferenciadas. Das quais apenas 12 homens eram dignos de um titulo de cavaleiro dourado.
Era simples de imaginar... um Chefe, 12 paus mandados e mais os pupilos desses. A força de cada um o determina quem recebe instrução de quem. Era a base da escola grega que conhecemos. Não foi difícil notar as pessoas que estavam fora do sistema mestre e pupilo, estes eram vassalos ou escravos.
Ao pensar naquilo, senti um arrepio frio nos braços e me abracei sozinha na sacada de meu quarto. Aquilo me deixava inquieta. Em pleno séc XXI e ainda existiam essas subdivisões sociais.
Mas observando normalmente tudo aquilo, não havia nada que levasse ao caminho sobrenatural que muitos declaravam sobre esses homens cavaleiros. Por horas a fio permaneci olhando as ruas apinhadas de pessoas normais a procura de algum dos 12 representantes das castas superiores dos cavaleiros e nada encontrei. Cheguei mesmo a pensar que aquele povo que dissertou sobre os cavaleiros tinham lido Nieztche ou Platão demais antes de escrever seus textos.
A tarde de céu azul havia se passado e transformou-se em um crepúsculo lilás no horizonte salpicado de nuvens. O vento morno deu passagem a uma brisa fresca com aroma e sabor de maresia.
Ah, detalhe, não tinha visto nenhum cavalo até então. Como podem haver cavaleiros sem cavalos?
A primeira noite foi tranqüila, o sono venceu toda atividade mental que eu pudesse ter. Ao primeiro contato de um raio de sol na janela, meus olhos se abriram. Não relutei em arrancar os lençóis de cima de mim e começar a procurar um bloco de notas e uma caneta.
Um sonho estranho havia ocorrido naquela noite. Um sonho sem imagens, apenas narrado por uma voz muito profunda.
Me apressei para escrever tudo que vinha na mente antes que esquecesse.
“Reza a lenda que existem 88 cavaleiros, um representando cada constelação existente no céu. E eram divididos em castas de: ouro, prata, bronze.”
Sacudi a cabeça após escrever algumas linhas, reli tudo antes de tirar os olhos do papel. Soltei tudo na cômoda e segui para o banheiro afim de tomar um banho morno.
Vesti uma túnica cinza clara de tecido leve e um cinto azul claro. A roupa ficara parecendo um vestido. Calcei uma sandália de couro e comecei meu dia de caminhadas.
Andar por esse “santuário” é como andar em um lugar fantasma, onde tudo possui olhos, mas você nada vê. Há sempre a sensação de que tem algo observando o que é feito por você.
A sensação de ser observada é quase tátil. Confesso que tudo isso me intrigou.
- O que há de tão diferente aqui que eu não consegui ver? Ou sentir... – em alguns momentos me pegava falando sozinha quando parava em frente a algum museu para tomar água ou comer uma fruta vendida em barracas na rua.
O local parecia uma feira ao ar livre organizada. Haviam locais onde comprava-se de tudo espalhados pelas calçadas. As frutas eram cortadas na hora pra você comer. Fiquei fascinada por isso.
- Eu senti muitas coisas e sensações desde que cheguei aqui. Não podem ser apenas coincidências.... – sussurrei comigo ao olhar para uma janela acima da calçada onde eu estava.
Um vulto trajando branco atravessou do outro lado vagarosamente. Um sorriso brotou em meu rosto. Me levantei da escadaria e segui o caminho de pedras que levava a uma ruína antiga envolta em poeira e areia.
Em certo momento de minha caminhada parei em cima de uma pedra de uma das muitas ruínas para observar tudo com outros olhos. Queria usar olhos mais sensitivos e menos científicos. Observei a cidade, as pessoas, os aromas, as cores, a forma com que o vento movia as poucas árvores.
Uma tristeza e uma revolta se apoderaram de mim. É como se o lugar tivesse sido banhado em sangue em tempos remotos, como se todo sentimento de raiva acumulado há centenas de anos tivesse para explodir a qualquer momento. E eu fosse a única que estava vendo aquilo.
Pedras não são silenciosas como as pessoas pensam...
Cerrei os olhos a procura de mais sensações e explicações. Nada era dito em palavras e sim escrito em vibrações energéticas fortes, contínuas, e em alguns instantes, segundos ou milésimos deles, elas explodiam.
Lembrei-me da forma com que alguns fanáticos se referiam aquela energia que eu sentia. A palavra “cosmo” me veio a mente, eu tinha lido nas pesquisas e textos de algumas pessoas.
Risos me escaparam pela boca.
- Cosmo.... que diabos eles querem dizer com isso? – uma brisa leve balançou meu cabelo e ouvi os estalos de algumas arvores que existiam por ali.
Por momentos permaneci pensando no planeta de onde tinha vindo. Ele havia sido destruído por algo parecido com essa descrição energética de COSMO que todos comentavam em seus livros. Um lugar tão remoto e tão ligado as sensações daquelas ruínas era estranho demais.
Até então eu não tinha pensado nesse nome tão bonito. Era quase poético chamar a força de um homem de cosmo. Remontava a idéia de que tudo nasceu um dia do universo.
Os cavaleiros morriam por isso, morriam por este cosmo que sentiam. Se lançavam nos braços da morte ao desejo de seu mestre e de seu protetor. Aquilo era poético... e ao mesmo tempo patético.
O pensamento de morrer por uma CAUSA MAIOR me arrepiou de novo.
- Inaceitável!!! – falei comigo mesma pela décima vez no dia, após virar o restante da garrafa de água gelada que andara comigo o dia todo.
Muitos pensamentos corriam livres pela minha mente.
Não é o que procuro saber. Alguém que morra por causas que muitas vezes nem se questiona. Eu procuro alguém que se pareça comigo, em algum aspecto.
- O que é tão inaceitável assim? - um vulto, sob uma capa branca surgiu ao meu lado silenciosamente ao sabor do vento.
Em um reflexo rápido, virei o rosto e enruguei a testa, unindo as sobrancelhas.
O que ele é? Como chegou sem eu perceber suas vibrações? Como??? Olhei rapidamente para os olhos dele, mas algo presente neles não me deixavam ver mais longe do que pupilas dilatadas em uma Iris escondida em uma sombra profunda.
Me virei de costas para ele, pousei os olhos nas ruínas e abracei minhas pernas:
- Esse lugar ... Essa estrutura antiga – olhei para sua roupa com o rabo de olho e apontei com o nariz – Essa roupa!! É tudo estranho, quase inaceitável, não acha? – Eu não esperava que ele soubesse sobre o que eu estava falando.
Um minuto de silencio pairou com o vento ao redor de nós.
- São regras - a voz dele me respondeu calmamente – Precisamos delas para viver.
Senti algo em sua voz que nunca tinha sentido em um humano comum. Uma luz, uma força, algo “especial”. Um brilho dentro daquela roupa, uma energia vinda dos olhos dele que eu mal podia ver mas que ia alem de muitas coisas que eu conhecia.
- Odeio regras! – respondi em tom de deboche ao abrir um sorriso - Como quebrar regras é meu passa tempo, já digo de cara que não conheço suas regras e já as odeio.
Mal via o rosto do indivíduo que falava comigo, o capuz da túnica branca se movia de acordo com o vento mas senti uma sensação calma e infeliz ao mesmo tempo.
Abracei minhas próprias pernas mais forte, abaixei a cabeça e encostei a testa nos joelhos. Sem motivos, senti lagrimas rolarem pelo rosto. Algo naquele lugar me cheirava morte que não havia sido velada ainda. Chorei como nunca tinha chorado antes. Sem uma razão minha. Sem motivo meu. Era como se as lagrimas de todos que não puderam chorar os mortos naquele lugar se manifestassem em mim.
Será que essa era a sensação que movia aqueles quem eu estava procurando?
Quando me virei para fazer um pergunta, o homem que falara comigo já estava longe e me disse em tom serio:
- Não posso ajuda-la com isso, garota. Com cada um desses sentimentos que sente, cabe a você decifrar.