Quem foi o 1.º felizardo a ter um celular aí?

Colocou a roupa de ginástica e saiu a passear com aquele tijolão.

Atravessou a pé todo a extensa área do condomínio fechado onde residia.

Sorria, enquanto conversava com a empresa responsável pela banda, que era um termo técnico significando a frequência da operadora e suas antenas instaladas pela região.

Enquanto falava, fazia cara de superior para todos os demais moradores, amigos ou conhecidos, que olhavam curiosos.

Alcançou a área externa e passou a caminhar por aquele bairro de classe ligeiramente média.

Naquele momento, sentia-se rico.

Um guarda, na rua, olhou-o desconfiado. E antes que o fardado pensasse que ele estava segurando algum tipo de explosivo, ele gesticulou e fez mímica com ajuda dos lábios explicando que aquilo era um telefone celular.

O guarda parou de franzir a testa e seguiu na caminhada, talvez indo para o batalhão onde trabalhava.

De repente, o sinal do celular caiu, justamente quando ele estava respondendo à pesquisa de satisfação da operadora.

Saiu, então, andando em direção à parte central daquela cidade. Esperava recuperar o sinal da rede sem fio porque certamente iria ser reconhecido e invejado por muita gente.

Na grande praça, com uma imensa lagoa, notou que o celular exibia outra vez o sinal operacional na tela.

Fez nova chamada para a operadora e começou a conversar outra vez com o funcionário que atendia casualmente. É uma pena que não tivesse ainda outro usuário para quem ligar — ele pensava consigo mesmo. Era o preço que pagaria durante algum tempo por aquela gostosa sensação de ser rico.

Enquanto entabulava conversa, forçando o operador do outro lado da linha a lhe ouvir, admirava seu reflexo na água da lagoa daquela extensa praça que lembrava um parque florestal.

Ficava muito bem no reflexo daquela superfície espelhada aquática.

Ficou surpreso quando pareceu enxergar vários reflexos de si mesmo, que foram se multiplicando com o passar de alguns minutos. O aparelho ele reconhecia nas imagens projetadas. Mas, cada reflexo parecia ser diferente e independente do outro.

Mas, que nada! Não havia anormalidade alguma na superfície espelhada da água que continuava paradinha sem ondulações.

Teve a ideia de olhar para os lados e notou que aqueles reflexos nada mais eram do que imagens reais de outras pessoas que já se juntavam em quantidade de mais de dúzia.

Foi aí que o orgulhoso Zendejá descobriu que não era ele, de fato, o único a ter aparelho celular por aquelas bandas. Os demais usuários também tiveram a ideia de posicionarem seus aparelhos à beira da mesma lagoa. Mas, parece que somente ele havia se achado rico por pensar que era uma das poucas pessoas da cidadezinha com poder aquisitivo suficiente para poder já ter comprado aquele tijolão, que representava o que havia de mais moderno em matéria de telecomunicação.

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Da coleção zezediozoniana: “Ô povinho metido a besta!”