Diário de um pobre

06 horas.

Eu acordo assustado,

o cachorro late pra todo lado.

Levanto, estou faminto,

a geladeira é meu caminho,

Mas que pena está vazia.

Às seis e trinta tô no banho,

o sabão é meu perfume.

Água fria e eu canto Bartô Galeno,

e me olho no espelho,

tá faltando dente no sorriso.

Sete horas eu ligo o carro

que está meio quebrado.

A bateria não funciona

e eu chamo a patroa

pra me ajudar a empurrar.

Ele pega meio no tranco,

já tô na fila do banco.

Cansado, esperando.

Pois o cheque voltou

sem eu mandar.

11 horas chego no trabalho,

o chefe olha meio de lado,

não se conforma com meu atraso

e diz que vai no salário descontar.

Tô na hora do almoço,

que é pedaço de pescoço,

engasgado e quase rouco,

mas preciso acostumar.

17 horas.

É fim de expediente.

Entro no carro muito quente,

ele quebra de repente

e ninguém quer empurrar.

Aproveito a ladeira,

ligo o carro sem besteira,

vou com o brega na cabeça

e o guarda quer me multar.

20 horas.

Chego em casa acabado,

a mulher mostra o sapato

que está descosturado,

pois tá velho de lascar.

O menino tá chorando,

pois o leite tá acabando,

e eu pergunto: até quando?

Será que eu vou suportar?

Ligo a televisão,

pra assistir o jornalzão

e quem sabe a solução

podem me apresentar.

A manchete é terrivel,

subiu o gás e o combustível

e o leite do menino

que continua a esperniar.

22 horas.

Vou pra cama pra dormir,

e a mulher diz: peraí!

tem coisa boa para ti

que preciso te contar.

Ela me fala de repente:

Mamãe vem morar com a gente!

Assustado eu pergunto: É pra sempre?

Você quer me assassinar.

E o dia tá terminando,

e meu diário vou parando,

pois a tinta da caneta tá acabando,

e eu preciso descansar.

Nelson Rodrigues de Barros
Enviado por Nelson Rodrigues de Barros em 14/09/2006
Reeditado em 14/09/2006
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