Adeus.

Não lembro muito bem do dia que ela chegou. Foi estranho. Estava escuro, um carro preto parou na frente de casa. Meus pais do nada aparecem com um cachorrinho igual àquele que eu queria tanto, um beagle, igual à da propaganda da Coca-cola (perceba como o marketing funciona).

Ela veio correndo, meio assustada, talvez seria o primeiro lugar que via fora de onde nasceu. Fiquei pensando que sentisse saudades da mãe e de seus irmãozinhos, numa chácara verde onde nascera.

Chamei de Pérola. Nome que eu me arrependi pouco depois: nome um tanto materialista, igual à ideia de querer o cachorrinho da propaganda do refrigerante. Mas tudo bem, o nome faz um pouco de jus: a cachorrinha era linda, calma como ela só. Uma joia.

Tinha uns maneirismos que davam graça: deitava-se toda esparramada com as perninhas para trás, molhava as orelhas longas ao beber água, agitava-se ao ver qualquer coisa de comer. Quando criança, passava muito tempo ensinando truques a ela, imaginando que um dia ganharíamos dinheiro divertindo uma plateia, num circo.

Companheira nos cafés da manhã, onde senta-se ao lado da mesa, esperando algo para filar. Companheira também nas leituras na rede, esperando um carinho, que quando parava me encarava até que eu retornasse com a mão sobre o pelo de novo. Empurrava a porta do meu quarto para entrar, cheirar tudo e voltar para a cozinha, seu lugar predileto. Se meu pai, exagerado em compartilhar petiscos com ela, demorasse para se levantar o café, ia para a beirada da porta e resmungava alto até que ele se levantasse: esperava no máximo até às 09:30 da manhã, pacientemente. Depois disso, ia resmungar.

Parceira dos dois outros finados cachorros: Feline, Flock...

Pérola, que sua calma nasça em mim, também. Sua indiscrição em esperar carinho de todos. Coração melhor que o seu não existe. Sentiremos saudade.