"Última poesia" do filme Febre do Rato*

*Encontrei apenas duas transcrições desta cena na internet, porém as duas estão, a meu ver, incompletas e pontuadas conforme a gramática convencional, não fazendo jus ao andamento da fala do personagem.

De qualquer forma, esta é uma terceira versão, apenas.

Qualquer dia que dispuser do puro ócio ou da plena vontade (que me motivou a transcrever esta cena) transcreverei o filme por completo.

*

“Eu passei os últimos dias pensando nela e fiz um poema, um não, fiz um monte... Quer ouvir?”, “Calma, aqui não“, “Quer ou não quer?”. Silêncio. “Querem ouvir?”, “Queremos!”. Vozes, aplausos e gritos. “Então vamo... Mas antes, quero convidar a todos aqui presentes a desnudarem seus corações. Tirem toda e qualquer barreira que possam impossibilitar a palavra de atingir seus corações”. Vozes, aplausos e gritos. “Eu vou”, “bora, bora”, “Coragem! Coragem! Coragem! Coragem! Coragem!”, “dá-lhe poeta!”, “Essa aqui...”, vozes, aplausos e gritos, “... Essa aqui vai para as coisas que não se realizam por excesso para as coisas que não são por não terem cabimento”.

Silêncio absoluto.

“Escrevi o meu nome no sacrário... Que se encontra ao lado da geladeira... E próximo aos pequenos frascos de remédio... E junto a isso tem uma estante... E sobre essa estrutura, um espelho... Que reflete o rosto do homem com quem cotidianamente tu compartilhas o dia... E faz... Coisas diferentes... Como: declamar o abecedário de trás pra frente... E eleger certas cores... Raras... Como suas preferidas. O homem comum, o mesmo do espelho, não... Acreditava muito nos pensamentos... E começou a listar: passei o dia contando passos... Arrumando coisas... Desfazendo nós... Roendo unhas... Falando só... Assistindo tevê... Descobrindo ruas... Circulando mapas... Fumando cigarros... Trapaceando bandidos... Viciando o organismo... Analisando sangue... Regendo conflitos... Adulando desejos... Reinventando sonhos... Evitando pânicos... Destratou seus sentimentos como que pedindo bênção a deus e ao diabo pra driblar das culpas. E entrou em casa. Deixou a arrogância lá fora descansando... Pra beijar a juventude que dormia no sofá. Beijou-a, e sua mão entrou tanto, tanto, e tão longe que alcançou o coração do sonho... E ali teve a certeza: que queria entrar no sonho por inteiro. Mas ela acordou e disse: que a organização é a maneira mais privilegiada de ser medíocre. O homem comum concordou... Enquanto retirava seu braço... Ainda... Com o cheiro... Do sonho”.

Tom R
Enviado por Tom R em 10/07/2013
Reeditado em 10/07/2013
Código do texto: T4379950
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