BOM DE ORATÓRIA. E QUERIDO IRMÃO MAÇÔNICO

Data:13/12/2012

BOM DE ORATÓRIA. E QUERIDO IRMÃO MAÇÔNICO.

Depois de nos tornar adulto e tomar ciência das coisas do dia-a-dia alimentávamos o desejo, inconfessado, de pertencer à maçonaria. O mistério e a mística que a envolvia, ressaltado pelos mais antigos, despertou nosso interesse até o momento em que aqui adentramos e passamos a integrar suas hostes.

Imaginem a satisfação ao recebermos o convite para dela participar, feito por Pedro Wladimir Calado Garcia, já falecido, companheiro de trabalho na Celpe! Mal refeito da surpresa começamos as providências para apresentação dos documentos requisitados. Um deles, o de antecedentes criminais, necessitava ser obtido no fórum.

Wladimir Calado nos indicou o de Olinda, cujo cartório criminal era chefiado por um escrivão, irmão maçônico e integrante da loja; ele providenciaria sua expedição.

Wladimir nos tranquilizou quanto a receptividade, pois iríamos manter contato com um serventuário bonachão, brincalhão, escroto todo, segundo suas palavras...Assim começamos nosso contato com esse funcionário, que na ocasião soubemos chamar-se Nildo Correia Ramos. Preliminarmente, entabulamos conversa na qual ele indagou se nós estávamos mesmo dispostos em pertencer à maçonaria.

Teceu comentário e elogiou o momento vivido pela loja naquela época; estava afastado momentaneamente das reuniões e, assim que se aposentasse, voltaria a frequentá-la. Tempos depois tal fato se consumou e, a partir daí, estreitamos nosso contato, já, então, ele exercendo a função de Orador.

Mais tarde, eu e Vilma, tivemos a grata satisfação de conhecer, também, sua esposa Marine que - feliz coincidência – possuía, tal e qual, o mesmo espírito despojado e brincalhão. Mas a passagem do tempo é ao mesmo tempo um aliado e um cruel oponente, pois o seu decurso pontilhado de alegria, decepção, tristeza, tem por epílogo o mistério maior. Um dia chegamos à loja.

Encontramos Nildo, sério, semblante carregado, abatido. Havia ido ao médico e sua saúde prenunciava gravidade irreversível; ele, sentado à mesa na sala dos passos perdidos, nos comunicou, solene, dispor de poucos dias de vida. Imaginem a preocupação e a tristeza que nos acometeu; saímos da loja naquele dia em completa consternação.

Mas o desígnio de Deus jamais pode ser antevisto; quando tudo parece perdido eis que, no momento oportuno, a interferência divina se fez presente. Felizmente para nós a previsão do grande Orador e à do médico não se concretizou.No entanto, outro período conturbado se avizinhava e quase o abatia de vez: o enfrentamento de outra insidiosa enfermidade; e a perda da batalha para salvar sua querida companheira, Marine.

Foram dias penosos, de muito sofrimento após a morte dela; pensou em tudo abandonar, tal a tristeza e prostração.Acreditava ter sua vida perdido a finalidade, o objetivo, a partir desse acontecimento... Mas sua missão na terra ainda não estava finda; o passar do tempo tudo remedia e ele voltou à loja. Sua crença na doutrina espírita muito o ajudou a contornar mais essa dificuldade.

Decorridos muitos anos do fato ora narrado estamos a compartilhar sua companhia, sempre coerente, tranquilo, ás vezes estressado e silencioso, comum entre os mais velhos.Nos conturbados momentos da doze de março ele sempre permeia e implementa sua intervenção como fiscal da lei, preocupado em harmonizar e pacificar a loja.

Ao contrário do que versejou Carlos Drumond de Andrade no poema famoso, ao longo do caminho percorrido por Nildo não houve apenas uma pedra. Houve várias, cada uma mais pesada que a outra, as quais ele, altivo, separou-as, poliu-as e empilhou-as, edificando junto com sua esposa Marine, simbolicamente, sua fortaleza física e moral.

Essa fortaleza integra as quatro virtudes cardeais a qual ele assimilou, juntamente com a prudência, a justiça e a temperança. Nessa fortaleza houve – e continua a haver - espaço para os amigos, para os mais de quarenta e tantos anos de dedicação à maçonaria na qual recebeu quase todas as condecorações.

Nessa fortaleza educou e formou os filhos, sua razão maior; nessa fortaleza há espaços, ainda, para lembranças dos tempos de mocidade no qual, fagueiro, embalou os sonhos que todos nós teimamos tornar realidade.Nessa fortaleza há espaços, por fim, para a solidão que às vezes nele faz morada, felizmente por pouco tempo...

Então ele, resignado, à maneira da poetisa Esther Esteremberg no poema Relicário, se vê recordando “...uma linda sequência de inesquecíveis fatos/Desde a mais tenra infância até o que hoje vivencia/E rememorando tudo, sua face se ilumina/Em lampejos de saudade, carinho e alegria/ “... afugenta, assim, importunas lágrimas/E se envolve em doce nostalgia.

Delineamos, portanto, a singular figura de Nildo Ramos. E mais: é grande Orador, é conciliador, é temperamental (às vezes), emotivo, chega com facilidade às lágrimas; não guarda ressentimentos; é ser humano em toda sua essência. Ele completou no dia 29 de dezembro passado oitenta e um anos de idade, no esplendor da idade madura.

Imbuído da mesma perplexidade do poeta Mário Quintana, ao contemplar o espelho do tempo e indagar de si mesmo: "quem é esse que me olha e é tão mais velho do que eu? (...) que importa?! Eu sou, ainda, aquele "menino azougado," que corria célere pela rua de minha infância...

Irmão Nildo, nessa data estávamos no período de férias maçônicas; ainda assim firmamos bem forte o pensamento e, em egrégora, levamos até você os fluídos positivos dela emanada.Como foi bom, hem! ter sobrevivido a todas essas turbulências, contratempos e desencontros para desfrutar, agora, da proximidade dos amigos e do aconchego familiar. Continue a contemplar a beleza da vida, essa dádiva maior a nós legada pelo grande arquiteto do universo.

Por fim, nós da loja 12 de março lhe cumprimentamos. Damos os antecipados e sinceros parabéns; que muitos anos ainda estejam por vir e, nesta ocasião, em uníssono, gritamos bem alto para ecoar no relicário do seu coração: QUERIDO IRMÃO NILDO CORREIA RAMOS: NÓS AMAMOS VOCÊ!

ANTONIO LUIZ DE FRANÇA FILHO - CIM:191.699

Advogado e aposentado da Celpe

E-mail:antoniofranca12@yahoo.com.br

Loja Maçônica 12 de Março de 1537

Data:13/12/2012

P.S: Nildo Ramos nos deixou no dia 04 de março de 2017, passando a habitar o mundo etéreo do desconhecido, o mundo das interrogações. A saudade daqueles que integram a Loja Maçônica 12 de Março é intensa.Seguiu em paz, tenho certeza, nosso amigo! Visiteio-o dias antes de sua partida; mostrou-se conformado e sereno, ciente da proximidade da morte.

ANTONIO FRANÇA
Enviado por ANTONIO FRANÇA em 14/12/2012
Reeditado em 10/05/2018
Código do texto: T4035696
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