ENTREVISTA COM FERNANDO

Fernando Fontana já sabia o que queria...

Nascido em 1975, Fernando é o mais velho de quatro irmãos e desde os 13 anos se mostrava diferente dos amigos da mesma idade, é, Fernando já sabia o que queria e o que seria futuramente. Ainda criança, Fernando levava como hobby as narrações de jogos de botão e de vídeo game que brincava com amigos e familiares.

Na primeira vez em que foi ao estádio com os irmãos e o pai, mais uma vez, mostrando sua diferença, Fernando pedia autógrafos para os narradores ao contrário dos irmãos que iam atrás dos jogadores, seria o destino? Para a mãe XXXXXXX, as diferenças evidenciadas de Fernando, mostravam que só seria questão de tempo para seguir sua carreira como jornalista.

Os autógrafos de seus ídolos comentaristas são guardados até hoje, Osmar Santos e irmão, Oscar Ulisses, Flávio Prado que o considera como pai e Vanderlei Nogueira, quem adorava imitar quando pequeno.

Um fato curioso é que todos os narradores com quem Fernando já trabalhou e trabalha atualmente, foram seus ídolos de infância. Coincidência ou não, isto deve ser evidenciado, mostrando assim a competência e um sonho de criança sendo realizado.

Descendente de portugueses e italianos, ao falar do avô e da história dele, Fernando mostra de onde veio a paixão pelo jornalismo e pelo futebol pode ter sido mais envolvida ainda. O avô foi diretor do Palmeiras, assim que fundou o palestra Itália e do Dante Alighieri também, um dos colégios italianos mais renomados de São Paulo.

Precocemente, Fernando iniciou a carreira em 1991, aos 16 anos quando se inseriu nos negócios da família. Era colunista do jornal voltado a colônia italiana, chamado Noi All’Estero, que começou com uma pequena distribuição e acabou crescendo muito. Foi preciso montar um escritório e ter um carro próprio para a empresa, mas o projeto da família foi interrompido, após o pai ser roubado pelo próprio sócio que deixou uma dívida enorme na gráfica onde era feita a impressão dos jornais.

Um momento que ele não esquece e conta com orgulho, aconteceu assim que entrou na faculdade e no famoso trote teve que pedir dinheiro. Ao aproximar de um carro e pedir ajuda, argumentando a entrada na faculdade de jornalismo, comentou que seria narrador como o José Silvério, um dos locutores mais famosos da época. Simplesmente, ao ouvir isso, o motorista o esnobou duvidando de seus objetivos, fechando os vidros.

Formado pela FIAM, Fefon, como é conhecido pelos colegas de profissão, após ter sido apelidado por Jorge Kajuru, tem 39 anos, é jornalista esportivo, repórter e apresentador do programa Bola na Rede, da RedeTV e é apresentador de um programa na Rádio Transamérica, na qual voltou a trabalhar recentemente.

Fernando pode ser considerado uma pessoa de muitas experiências e como ele mesmo diz, um cara sortudo, pois nunca ficou desempregado. Em 1996 trabalhou no SBT, quando cursava seu 2° ano de faculdade, um mês depois entrou na Jovem Pan e, posteriormente, arrumou mais dois novos empregos, um na Rádio Difusora, cobrindo o futebol português, com o Martins Araujo e outro no site Pelé.net, que foi um dos primeiros grandes sites de futebol internacional.

Nesse período, Fernando teve que interromper sua formação, pois com a falta de tempo, acabou não dando conta de ir a algumas aulas, reprovando por falta em uma matéria. Vendo que não havia possibilidade de seguir adiante, Fernando trancou a faculdade e não se formou junto com a turma, pode se formar somente um ano depois. Agarrar todas as oportunidades de trabalho é uma das qualidades que possui.

Fernando passou pela Transamérica entre 2001 e 2002 e logo em seguida foi para a RedeTV, empresa na qual está até hoje. Já narrou alguns jogos do Campeonato Brasileiro pela Rádio Expressão FM e também trabalhou na Rádio Cacique de Santos.

Ainda falando em trabalho, Fernando cita o programa “Gol grande momento”, da TV Bandeirantes, em que fazia os textos narrados por Milton Neves.

Um momento de realização profissional foi quando entrou na Jovem Pan, pois no começo da carreira gostava mais de rádio, era o sonho daquele menino esperançoso de brilhar numa rádio renomada. Mas ao trabalhar, Fernando perdeu o encanto, não gostando de algumas atitudes antiéticas e acabou saindo de uma maneira não muito agradável, lesado e decepcionado.

Além do amor a profissão, Fernando também lecionou recentemente aulas no SENAC, no curso chamado “Transmissão esportiva”, que prepara narrador, repórter e comentarista. O curso é tanto teórico quanto prático, leva os alunos divididos em grupos para os estádios. Com um bom relacionamento com a imprensa, Fernando consegue inseri-los para ouvir os vários tipos de narração e para saber como sai a escalação. Os palestrantes são compostos por um treinador para falar sobre tática esportiva, um árbitro para tirar as dúvidas sobre arbitragem e um médico para saber os tipos de lesões que podem acontecer dentro de campo e o tempo de recuperação para cada uma delas.

Vários alunos já trabalham na área tornando-se gratificante para Fernando, uma missão a qual se prestou e conta com o mesmo orgulho e paixão que possui pela profissão de jornalista. Seu propósito era levar o mesmo curso para uma universidade, sendo em nível técnico e há um mês conseguiu implantá-lo na Universidade Ibirapuera.

Um planejamento seu de vida é gradativamente sair da reportagem, são 17 anos dedicados a essa especialização e como surgem novas oportunidades, se dedicar mais a narração e apresentação é uma expectativa de Fernando.

Fernando não é ambicioso, como ele mesmo se retratou, as coisas acontecem naturalmente. Um cara reservado, em suas horas vagas Fernando gosta de assistir filmes, não é a toa que possui uma coleção de cerca de mil filmes, que aos poucos estão sendo adaptados para Blue Ray. Ler, ir ao teatro e jogar boliche também são algumas das coisas que o atrai. Daí vem o questionamento, sim, Fernando prefere um barzinho a uma balada.

Quando falei sobre o romantismo, Fernando logo disse achar um charme e é um galanteador a moda antiga, gosta de dar presentes fora de época e de um belo jantar a luz de velas.

Entrando mais a fundo em sua vida particular, ser desorganizado talvez seja seu maior defeito, mas uma coisa que o deixa mais amargurado é o fato de ter abaixado a cabeça para certas coisas, foi um dos erros que poderia não ter deixado acontecer, mas em contrapartida, ser um cara amigo, legal, é uma de suas maiores qualidade, atraindo assim pessoas ao seu redor pela simpatia e disponibilidade para conversar e descontrair.

Fernando sempre foi católico, porém achava que no catolicismo faltava algo, então descobriu a religião espírita e, a partir dessa experiência, se mostrou presente em suas idas ao centro espírita todas as terças-feiras. Um programa fixo semanal que lhe faz muito bem.

O pai foi lembrado em uma das primeiras citações, pois Fernando ainda não engole o fato de o pai ter sido criado fluentemente em duas línguas, com o italiano de diferencial e em sua criação e na de seus irmãos não terem o mesmo privilégio.

Solteiro e dono de uma alegria contagiante, Fernando é padrinho de quatro crianças. Isadora e Pedro são os xodós, ainda esse ano nascerá Felipe e Júlia, para completar a lista. Ao falar deles, Fernando dispara que o amor e a consideração estão na mesma intensidade, são sua alegria e ainda afirma largar tudo para ficar com eles.

As avós também foram as paixões de sua vida, Hirma D’arace Vergueiro, sua avó materna, faleceu após uma grande luta contra um câncer, chegou um tempo em que não reconhecia mais as pessoas, um drama familiar que o abalou muito. Outra pessoa que se encaixa na palavra saudade é a sua avó paterna, Tereza Leonardi Fontana, que era traída pelo avô, se separou e trabalhou muito para conseguir criar os quatro filhos.

As duas são retratadas, com um sorriso no rosto, mas ao mesmo tempo com a lágrima saltada em seu olhar, pois mesmo com muitos altos e baixos, elas jamais, em hipótese alguma, perderam o bom humor e isso o deixa orgulhoso.

Como é de prestar bastante atenção, família é a base de tudo. Após morar no Morumbi, cada um dos irmãos se separaram e foram seguir a própria vida, mas Fernando, do tipo conservador e que honra seu posto de filho mais velho, é o único que ainda mora ao lado da mãe, no bairro do Itaim.

Aquele ditado de que você só conhece a pessoa quando se separa, certamente Fernando conhece bem. Após ser amasiado durante quatro anos, ao se separar, Fernando foi injustiçado e apunhalado pelas costas, perdendo um apartamento e alguns bens materiais comprados por ambos.

Todos nós temos medos, Fernando tem medo de altura e cobra, mas seu o medo de fracassar na profissão que tanto ama, é ainda maior que qualquer outro, pois já teve problemas com cinegrafistas, por causa da falta de sintonia e de dedicação, na qual não se adequou com seus colegas. Fernando reclama da falta de amor e de interesse que algumas pessoas possuem em suas carreiras.

Quem tem amigos tem tudo, as pedras preciosas que o ajudaram muito em sua trajetória e que são evidenciados durante todo tempo na entrevista, são Flávio Prado, Bruno Prado, José Calil, Albino Castro, José Emílio, Jorge Kajuru, não podendo deixar de citar Otavio Previdi, mais conhecido como magrão, que o efetivou como narrador de TV, na Rede TV e o Sidney Bertotto que o efetivou como apresentador no Bola na Rede.

Pela profissão, Fernando já passou poucas e boas, quase apanhou de torcedores do Coritiba, num jogo da série B. O objetivo era atrasar o jogo em três minutos, pelo atraso do programa, quando o árbitro começou a empurrar e a torcida esbravejar, Fernando já tinha ganhado o tempo necessário. Só que, no intervalo, teve que atrasar mais dois minutos e ele, como um bom entrevistador e de belas táticas, intercalava os jogadores e acabou saindo expulso por dois seguranças.

Ao final do jogo ficaram uns 40 torcedores de um lado da cabine e 40 do outro, o hostilizando com ofensas e ameaças após sua saída do estádio. Já era da RedeTV e foi obrigado a sair no porta mala do carro do SporTV.

Ao final da entrevista, fizemos um papo mais descontraído para conhecer um pouco de seus sonhos e de algumas realizações pessoais. Uma narração inesquecível foi na final do Campeonato Inglês, eram dois jogos simultâneos, enquanto narrava o jogo do Manchester City, o Manchester United jogava no mesmo horário, lutando pelo título nacional, era expectativa total, sofrimento de ambos, o United terminou o jogo sendo o campeão quando, aos 46 minutos do segundo tempo, o City fez o gol e foi o campeão inglês.

Já falando de reportagem televisiva, o momento em que foi para Dublin cobrir a Uefa Europa League, jogo entre Porto e Braga, final entre dois times portugueses, Fernando se diz encantado com a organização do evento, diferentemente de muitos campeonatos que já vivenciou.

Um jogo ao qual queria ter narrado foi a final da Copa do Mundo de 2002, que o Brasil ganhou da Alemanha. Um baita jogo, seleção fora do comum, em que Rivaldo se destacou muito, dispara Fernando.

Falando da parte das travessuras, Fernando voltou ao seu tempo de infância e relembrou algumas histórias engraçadas. Ainda pequenos, sua mãe contratou uma babá que foi apelidada por seus irmãos de babá da ditadura, ela não os deixava brincar e ficar perto do irmão caçula ainda bebê. Uma simples brincadeira de criança foi o dia em que eles entraram no quarto pela janela e retiraram o caçula pelo telhado.

Mais um fato a ser lembrado, eram as coleções de figurinhas de álbuns, que ao juntarem muitas repetidas, eles começaram a vendê-las, uma pelo preço de um pacote que vinha com cinco. Ladrões, essa foi a acusação a Fernando e seus irmãos, feitos por algumas mães dos vizinhos que compravam essas figurinhas.

Já voltando aos dias de hoje, Fernando conta histórias com seus queridos amigos de profissão. Na Jovem Pan, o Nilson César narrava o jogo da Copa Nap, que era com equipes de faculdades e por não conhecer os jogadores, havia a necessidade de ter um rascunho com os nomes para a narração. Fernando e o Flavio Prado pegavam os rascunhos, jogavam fora e a transmissão era feita na base do improviso, com algumas confusões de nomes.

A Jovem Pan dava um bolo pro aniversariante do mês e o Renato Tranco, também um querido amigo, veio de Campinas buscar o bolo e de novo, Fernando e Flavio Prado, estavam sacaneando, distribuíram pedaços de bolo para a redação e colocaram a agenda telefônica nos pedaços que foram retirados e embrulharam novamente. Ao levar para casa e ter a espera de várias pessoas, para a comemoração do aniversário, Fernando levou várias broncas.

Já que Fernando é apaixonado por filmes, fiquei na curiosidade de saber quais eram os seus favoritos. Comentou sobre “A Lista de Schindler”, que o marcou muito como história. “A espera de um milagre”, o cara que era uma dádiva de Deus e acabou sendo condenado injustamente. “Adeus, Lenin”, que fala sobre a queda do muro de Berlim e “Corra, Lola, corra”, que trabalha com o desperdício de tempo que pode ser aproveitado.

Na reta final da entrevista, perguntei-lhe para qual time torcia e acabei me surpreendendo com a resposta, Newscatle, time inglês. Fernando aprendeu, com o tempo, a respeitar times brasileiros e por isso torce por um time de fora.

Quando perguntei sobre um ídolo do futebol brasileiro, João Paulo, ponta esquerda que jogou no Corinthians, no Santos, foi lembrado rapidamente, mais conhecido como “o papinha da vila”, Fernando o admirava muito com sua agilidade e precisão.

Em sua infância, o jogador lembrado como extraordinário foi o Maradona. Fernando ainda cita Pelé como o melhor de todos os tempos, porém lamenta o fato de não tê-lo visto jogar.

Para Fernando, o maior goleiro do Brasil foi o grande São Marcos, tecnicamente impecável, um goleiro a altura de tudo e de todos. Já falando sobre o melhor técnico, Rinos Michels, criador do carrossel holandês, que foi uma grande revolução da década de 70, foi relembrado, mas da atualidade, Pepe Guardiola, atual treinador do Bayern de Munique, é reverenciado por Fernando por saber utilizar os jogadores e suas características, sendo um beneficio para o time. O ex-técnico do Corinthians, Tite é citado como fora de série.

Para finalizar e mostrar ainda mais que sua carreira profissional é brilhante e cheia de histórias para contar, Fernando fala da sua próxima etapa que é finalizar o livro “Fora das quatro linhas”, que retrata histórias, acontecimentos com os jogadores, técnicos e pessoas ligadas ao futebol, que não foram ao ar e que não aconteceram dentro de campo. Histórias curiosas, de vida.

Bruna Alves