E o Tempo se Apaixonou pela Distância...

 

Da união nasceram dois filhos: a Velocidade e o Aqui-agora. Tinham temperamentos opostos e por isso suas vidas nunca se cruzavam. 

 

Velocidade era inquieta. Seu DNA era composto essencialmente de quilômetrros - que herdara da mãe -  e horas - que herdara do pai. Sentia-se  instigada a movimentar-se sem parar, cada vez mais rápido, alimentando-se do que absorvia dos cenários instáveis de sua existência, fugazes mas repetitivos, dos quais mal podia formatar um conceito mais profundo.

 

Em resposta,  usava seus atributos com intensidade crescente para fazer desfilar aos seus olhos cada vez mais cenários que pudessem satisfazê-la. Mas o resultado era sempre o mesmo: na medida em que as paisagens se multiplicavam reduzia-se o tempo em que podiam ser observadas, deixando em sua observadora um vasio cada vez mais angustiante que alimentava o circulo vicioso inevitável.

 

Aqui-agora, ao contrário, deleitava-se com cada momento vivido, não importa onde estivesse. Tratava o que lhe fora transmitido pelo pai - o tempo -  como a eternidade, e o espaço - dos genes da mãe - como a infinitude. Vivia em extase sobrepondo o espaço infinito ao tempo eterno.

 

O que para sua irmã, Velocidade, era km/hora, para Aqui-agora era o ubíquo sobre o sempre. Vivia em cada ponto do espaço infinito a cada momento do tempo eterno. Fazia juz ao seu nome.  Sabia que, se o espaço era infinito, não tinha como fugir do aqui, pois iria encontrá-lo onde quer que chegasse; e, se o tempo era eterno, não precisava  ansiar pelo futuro, ou ater-se ao passado, pois o tempo estaria sempre à sua disposição no  agora e ao passado nati-morto não poderia ter acesso, a não ser, ilusoriamente, com as lembranças e sentimentos ocorridos agora. Sabia que o tempo e o espaço - seus traços genéticos - somente poderiam ser experienciados verdadeiramente se fizesse valer seu nome: Aqui-agora.

 

Mas um dia aconteceu... Velocidade encontrou Aqui-agora. Em sua busca frenética e incontida por novos cenários, em tempo cada vez mais reduzido, o espaço que Velocidade percorria em tempo mínimo tornava-se cada vez mais vasto; tão amplo ficou que acabou abrangendo o Todo. Dissolveu-se no infinito. E o tempo, cada vez mais curto, já não podia ser observado, nem medido, nem sentido. Acabou por desisntegrar-se; reduziu-se ao eterno, onde micro e macro se tornam um só coisa.

 

Assim, o que era quilômetros por hora tornou-se espaço infinito por tempo eterno. A Velocidade, tão intensa se tornou que acabou  quebrando a barreira do tempo/espaço. Cruzou o portal do infinito-eterno. Encontrou finalmente sua irmã mais "velha" que já passara pela experiência vidas atrás.