Gostar de você mesmo
Há um conselho que é dado com muita frequência a pessoas com baixa auto-estima: goste de você mesmo, pois se você não gostar de ti, quem é que vai gostar?
Embora possa haver aí uma boa intenção por parte de quem faz a sugestão, esse conselho é claramente de pouca ou nenhuma eficácia para pessoas que já estão com a auto-estima em frangalhos.
Parte-se da ideia que a auto-estima é uma coisa criada de si para si, sem participação do mundo externo, o que me parece bastante equivocado. Imagine uma pessoa que tem algum defeito físico, sofreu bullying durante toda a vida, foi maltratado em casa, não tem amigos, está desempregado, vive, enfim, uma vida extremamente solitária. Parece praticamente uma crueldade chegar para esse sujeito e dizer coisas como “se ame, só então os outros poderão te amar”.
O amor-próprio, assim me parece, é fruto da mediação com as outras pessoas. Se eu tenho o meu valor é, sempre, em comparação com a realidade que me cerca. É a partir da relação com o mundo externo que eu posso conhecer aquilo que tenho de diferente ou especial. Não é nenhum exagero dizer que dependo do Outro para conhecer a mim mesmo e formar a minha auto-estima.
E aí, de repente, exige-se, de quem está com problemas nessa mediação, a responsabilidade solitária de amar-se para pode ser amado. O conselho tem, naturalmente, o benefício de isentar a participação do próprio conselheiro no processo de reconstrução da auto-estima: isso é lá com ele mesmo.
Quem não tem auto-estima, no entanto, diante de um conselho que lhe cobra toda a responsabilidade do seu mundo, pensará apenas: “Eu não sou capaz”.
E não é capaz mesmo, como ninguém é capaz de, sozinho, encontrar o seu valor e sua especificidade.