etimologia da lingua portuguesa nº80

Etimologia da Língua Portuguesa por Deonísio da Silva nº80

No Brasil, maio tradicionalmente é considerado o mês das noivas, que se preparam para conjugar o verbo coabitar, do latim cohabitare, viver intimamente com outra pessoa. Isso, entretanto, continua proibido para padres, que têm o ônus , do latim ônus, do celibato.

Coabitar: do latim cohabitare, habitar com alguém na mesma casa, morar junto, dividindo intimidades como pretendem os noivos, antes ou depois do casamento. Significa também fazer com que ideias opostas sejam a mutuamente toleradas, não apenas nas relações amorosas, mas também nos regimes em que autoridades de partidos políticos diferentes são obrigadas a dividir o poder e, mais especificamente, levar a vida de casado, ainda que os parceiros não sejam oficialmente cônjuges. Desde o Conselho de Trento, a Igreja proíbe que os padres se casem, que levou a uma debandada geral do sacerdócio, sobretudo depois do Concílio Vaticano II, realizado em 1962 a 1965. Convocado pelo papa João XIII ( 1881-1963 ) e concluído por Paulo VI ( 1897-1978 ), decepcionou aqueles que esperavam que o celibato acabasse abolido e prática contraceptiva como fossem autorizadas.

Ônus: do latim onus, peso, encargo, difícil, trabalho. No latim designava também a gravidez e, quando a mulher dava a luz, o rebento, dizia-se ônus naturae deponere, deixar o peso da natureza. Aparece em textos em que se alude ao ônus da prova – a obrigação que tem quem acusa de provar o que alega – e ônus do cargo, obrigações de autoridade.

Rito: do sânscrito rtám , ordem, pelo latim ritus, uso, costume, cerimônia. Como na antiga Roma o religioso e o político se misturavam, às vezes a ponto de se confundirem, rito passou a designar preferencialmente o modo de celebrar ato religioso, de que é exemplo o casamento, que pode ser realizado apenas no civil, mas que é feito também no religioso e de acordo com os ritos do catolicismo, religião declarada pelo maior número de pessoas no Brasil tido como o maior país católico. O brasileiro é envolvido pelos ritos religiosos ainda quando não tem consciência do que simbolizam, como no batismo e na crisma. Para este segundo sacramento, predominou o feminino, aplicando-se o masculino apenas ao óleo utilizado na maioria dos seis sacramentos.

Seminarista: de seminário, do latim seminarium, lugar onde se plantam sementes para germinar e depois serem transplantadas. Passou a designar, menos frequentemente, quem participa de um seminário, evento científico ou cultural sobre determinado tema e em especial o menino, adolescente ou adulto que estudou nos seminários, criados pelo Concílio de Trento para formar padres. Antes, do adulto que quisesse ser padre, era exigido pouco intelectualmente, foi decisão tridentina internar os candidatos ao sacerdócio por 14 anos: um, de admissão ao ginásio; sete para o ensino médio; e seis para Filosofia e Teologia. Muitas vezes. Menos de 10% dos meninos eram ordenados sacerdotes, pois a Igreja não apostava só na qualidade da formação intelectual exigia também submissão aos dogmas, votos de castidade e solteirice eterna. Desses requisitos, o primeiro foi descartado e os seminários entraram em decadência em quase todo o mundo.

Tridentino: do latim tridentinu, declinação de tridens, que tem três dentes, como o tridente que o deus pagão Netuno tem em uma das mãos . A cidade de Trento, na Itália, homenageia esse deus do mar porque em tempos antigo semelhava Veneza. O símbolo do planeta que leva seu nome é um tridente estilizado. Tridentino é o habitante de Trento e tudo que se refere a essa cidade italiana. Benito Amilcare Andrea Mussolini ( 1883-1945 ), ditador italiano, trabalhava em jornal de Trento quando escreveu o romance A Amante do Cardeal. Mas tridentino designa sobre tudo o que foi decidido no concílio ecumênico ali realizado entre 1545 e 1563, o mais longo da Igreja, convocado para fixar os dogmas e combater a Reforma. E então ganhou o mundo a Contrarreforma. Durou tanto tempo que quatro papas o presidiram: Paulo III (1468-1549 ), que o convocou; Júlio III (1487-1555 ) e Marcelo II (1501-1555 ), que o continuaram; e Pio IV (1499-1565 ), que o encerrou.

Vulgata: do latim vulgata, feminino de vulgatus, divulgado, isto é, conhecido dos vulgos, os populares, o povo, tornando-se vulgar, isto é, próprio da multidão. Veio da expressão do latim medieval vulgata editio, edição popular. Com a eliminação de editio, passou a designar a edição da Bíblia em latim, cuja tradução é de São Jerônimo (340-420), que traduziu do grego os manuscritos do Novo Testamento e do hebraico os do Antigo Testamento. Mas foi apenas no século XVI, no Concílio de Trento, que a Igreja declarou oficial e de uso comum a Vulgata.

Deonísio da Silva, escritor, é doutor em Letras pela Universidade de São Paulo, professor, coordenador de Letras e das teleaulas de Língua Portuguesa da Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro, e autor de A Língua Nossa de Cada Dia e Goethe e Barrabás (editora Novo Século ), entre outros 31 livros, alguns deles publicados também em outros países. Blogue:http://eptv.globo.com/blog E-mail:deonisio@terra.com.br

Revista caras

2009

Doutor Deonísio da Silva
Enviado por zelia prímola em 13/05/2017
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