AMOR E LIBERDADE

''A única forma de lidar com um mundo de cárcere é de nos tornarmos tão absolutamente livres que a nossa própria existência seja um acto de rebeldia.”

(Albert Camus)

Se tivesse que escrever, sob o ímpeto de meus devaneios e reflexões, um tratado filosófico a respeito do amor, sem dúvida nunca deixaria de fora de minhas discussões os poetas e os músicos: amantes sem igual de sua verdade, uma verdade que habita no interior daqueles que são bons, sinceros e de grande simplicidade.

A partir do momento em que damos a oportunidade para a sublime fortaleza do amor tomar conta de nosso ser, somos movidos pela bondade e pela liberdade de amar nosso semelhante tal como um sábio inspirado nos mandamentos de Deus. São eles, os músicos e os poetas, com sua singular criatividade, os que mais conseguem (com genialidade sem igual) abordar assuntos elevados e sublimes, como por exemplo, o amor, a liberdade e a transcendência.

Tais assuntos, de fato, desafiam a ciência na sua busca pela objetividade e pela clareza; temas como liberdade, amor, redenção, fé e espiritualidade surpreendem e escandalizam os incrédulos defensores da objetividade científica, impossibilitando-os de reconhecer a clareira da transcendência no âmbito da existência humana (não que a comunidade científica não possa abordar esse assunto tão sério, mas nos dias de hoje negligencia muito as questões mais sagradas da vida, de modo a empobrecer qualquer entendimento sobre a transcendência do homem mediado pelo amor e pela compaixão, embora tenha havido na história, cientistas --como Jung e Viktor Frankl--, que tiveram outra postura frente a essa questão).

O amor nos liberta do egoísmo e das amarras da culpa e do ódio, por isso é tão difícil nos dias de hoje escrever sobre ele, quanto mais prática-lo com toda a sinceridade de coração. Mas a arte, a religião, a psicologia mais profunda e a filosofia assistemática dos livre-pensadores vem a preencher essa lacuna. De fato, tais áreas do conhecimento humano surgiram para enriquecerem a humanidade, abrindo caminhos de compreensões para que o homem repense e medite sobre sua própria vida e acerca de sua própria história.

O amor nos faz seres vitoriosos, por isso o ódio nada pode fazer para nos cegar, principalmente ao darmos espaço e abertura para a sua fortaleza prevalecer em nosso coração; vale lembrar que é uma dádida que provém de DEUS e quem está com ele e nele se apega com toda sinceridade, recebe essa jóia que emana da eternidade. Como bem disse uma vez Cazuza, com sua bela canção (escrita com tamanha paixão e entusiasmo): '''Como é estranha a natureza morta dos que não têm dor/ Como é estéril a certeza de quem vive sem amor''. Com efeito, viver sem amor e sem saber reconhecer o seu valor no coração dos homens, é como viver uma existência imersa no engano e no vazio.

Quanto a liberdade, muito já se contestou a respeito de sua existência, muitas vezes não sendo sequer objeto de estudo das mais diversas ciências, pois grande parte delas, não todas, é claro (há ciências que buscam valorizar a problemática da liberdade e o que o homem faz desta nas suas ações), estão fundadas no determinismo, no qual o homem passa a ser o produto das contingências ou, então, do inconsciente, seja ele pessoal ou coletivo.

A liberdade, também muito abordada pelos poetas e filósofos, não é algo que pode se mensurar e apreender pela racionalidade científica; é, antes de mais nada, algo que escapa de qualquer controle e previsão (...) a liberdade se dá quando temos a capacidade de criarmos novas possibilidades de existência humana, ampliando o horizonte de nossas perspectivas até onde o sonho de alçarmos voos outrora inimagináveis nos permite alcançar. Quando fazemos esse movimento, de ampliarmos nossas perspectivas e de criarmos novas possibilidades de vida, é que a liberdade pode ser pensada com toda nossa paixão!

A liberdade também se dá nas manifestações criativas do homem, sendo ela mesma a própria criatividade humana atingindo os céus mais elevados da inspiração. A liberdade também está presente quando a responsabilidade do ser humano pelos outros homens e a responsabilidade pelos animais e pela natureza, estão presentes na foro da consciência. A liberdade se realiza principalmente quando o projetos dos homens são fundados por princípios sólidos e coerentes, impulsionando-os às grandes realizações em prol do verdadeiro significado da vida.

A vida é fluida como as águas caudalosas de um rio, pois a todo momento está num processo de vir-a-ser; sendo assim, porque não pensarmos a liberdade como a capacidade de criarmos boas alternativas frente a situação em que vivemos, de modo a superarmos com a persistência de nossas aspirações e com a força de nossa vontade, a inexorabilidade de nossa condição, uma vez que a todo momento estamos sujeitos a possibilidade das mudanças?

A condição em que vivemos, sem dúvida, nos limita e nos fixa por um curto ou longo prazo de tempo. Mas é importante percebermos que vai depender do cada um de nós criar coragem ou nao para transformar nossa árdua condição, pois não somos (como diz muito bem Sartre) responsáveis pelo que fazemos, mesmo quando não nos sentimos responsáveis pelas nossas próprias ações? Não é verdade que agimos intencionalmente em relação a um acontecimento, mesmo que sejamos ignorantes e não tenhamos tido condições de aprender a ser pessoas diferentes, movidas pelo sentimento de que precisamos mudar?

A liberdade não é a mesma coisa que livre-arbítrio (este é a liberdade de escolha do que já está determinado, do que está a disposição para ser escolhido como alternativa). Por ser um pouco diferente de livre-arbítrio,a liberdade vem a ser a capacidade de encontrarmos a vitória contra tudo aquilo que pode impedir o surgimento do verdadeiro sentido da vida, nos quais experimentamos uma sensação de amplitude de nossas perspectivas impulsionadas pela nossa vontade de viver.

Quando somos movidos por um objetivo e um propósito elevado que nos faz mais resistentes às grandes tormentas da vida, aprendemos a imaginar situações hipotéticas mais favoráveis à nossa existência, dando espaço para os sonhos povoarem o nosso mundo interior.

Somos livres quando abrimos mão da alienação e do embrutecimento do espírito, a fim de cuidar de nós mesmos e de quem necessita de nossa doação espontânea; pressupõe, antes de mais nada, que haja uma reflexão profunda sobre a condição humana ferida pela banalização do egoísmo, além, é claro, uma conscientização sobre a importância do amor enquanto instrumento de libertação das mazelas sócio-econômico-culturais, o qual estas vem a ser as grandes responsáveis pelo nosso ofuscamento das pessoas no mundo pós-moderno.

As relações humanas estão deturpadas porque nos dias de hoje deixou de ser valorizada a verdade do amor que habita no coração do homem simples e sincero.Vivemos num momento histórico onde o ter é o que impulsiona a vida em sociedade, e poucos são os que, seriamente, pararam para refletir sobre a nossa condição e os prejuízos que arcamos com as dificuldades de mantermos por longo tempo relações de solidadriedade e de amizade. Pois nas relações humanas o que impera mesmo é a sua objetificação, a tal ponto que em muitos setores da sociedade é o egocentrismo a única dimensão possível de ser no mundo.

Mesmo o amor, estabelecido entre um homem e uma mulher (onde o ágape se une ao éros para consolidar uma dimensão mais profunda na relação entre pessoas), está ameaçado pela incapacidade de grande parte das pessoas de amarem uns aos outros sem qualquer jogo de interesse e sem qualquer mesquinhez. Todavia, o amor conjugal só se torna possível, tal acontecimento só se torna uma realidade, quando o compromisso, o companheirismo e a sinceridade se fazem presentes nessa relação, que não deixa de ser uma das mais belas entre os seres humanos!

Mas o que podemos dizer a respeito de amor incondicional em nossa época? Pois falar de amor incondicional se tornou um escândalo em nossa sociedade mercantilista, algo quase subversivo entre as pessoas, ficando reservado a possibilidade de se pensá-lo nos estritos limites das igrejas, onde ainda felizmente se permite tamanha sublimação, uma sublimação que eleva consideravelmente o nosso espírito.

Apesar dessa crise existencial e espiritual que o homem contemporâneo atravessa devido ao esfriamento do amor do coração de inúmeras pessoas, uma situação presenciada por todos nós a todo o instante (sendo, infelizmente, uma realidade existencial evidente, capaz de gerar impasses e tabus nas relações humanas), o amor ainda é exprimido em quase todos os lugares através de tantas músicas e manifestações artísticas espalhadas pelos quatro cantos do mundo.

Se o convite ao amor é ainda entoado pelos artistas e cantado por uma multidão de pessoas sonhadoras, talvez se deve ao fato de que no fundo de muitos de nós ainda almejamos que um dia sua verdade possa se manifestar em nosso ser; é porque viver de amor ao lado de uma pessoa muito querida, continua sendo uma das maiores conquistas do homem em sociedade. Viver de amor é o sonho de todos aqueles que tem fome de imortalidade; viver dessa dádiva é a aspiração de todos aqueles que buscam incessantemente a eternidade!

Quem é capaz de amar com sinceridade de alma está liberto dos jogos de interesse reinantes, das mentiras e da falsidade nas relações; quem sabe amar aprende o segredo da liberdade, pois é este sentimento o que mais nos liberta e nos faz vencedores contra as barreiras que nos impedem de vermos e sentirmos algo bem mais profundo e penetrante do que estamos habitualmente acostumados.

Por isso, vejo o amor como uma força que está para além de qualquer relação objetal, pois o outro deixa de ser um mero objeto a serviço de interesses egoístas e mesquinhos e passa a ser reconhecido como um ser humano que vive e sofre, chora e se emociona; de fato, é alguém que passa a ser percebido não como algo coisificado, mas como uma pessoa que merece ser amada e valorizada com a verdadeira arte de amar.

Quem atingiu esse estágio de consciência aprendeu a ser livre das ciladas do egoísmo e através desse despertar de consciência, é capaz de vencer o véu espesso que nos cega e embota. Quando desenvolvemos a capacidade de demonstrar sentimentos em profundidade, sentimentos como aquele que é ensinado pelo cristianismo, como o de amar o próximo como a si mesmo, nos tornamos pessoas mais ornamentadas de esplendore graça.

Se o estranho e até mesmo o ofensor tem esse direito reconhecido, o direito de ser amado, o que dirá aqueles que estão mais próximos de nós, aqueles que queremos viver juntos e assim estabelecer uma relação mais permanente, uma relação que nos faz pensar no eterno amor de DEUS pelas nossas almas?

Na vida experimentamos grandes lutas, a todo o momento precisamos de DEUS para nos fortalecer em fé, amor e sabedoria, a fim de alcançarmos a redenção que almejamos incessantemente.Travamos, principalmente quem ainda sonha em ser livre das ideologias para lá de suspeitas e dos valores sem fundamentos sólidos, uma batalha contra o condicionamento social, os determinismos, os rótulos e os estereótipos que querem nos manter presos e confinados em suas fronteiras, de tal forma que em muitas situações deixamos de ver algo mais sublime em nossa frentes, apenas para satisfazer as exigências de uma sociedade e de tantas ideologias dissolutas.

O ser humano, quando busca a liberdade durante sua existência, sempre oscila entre o que é imanente e o que é transcendente, está fixado num contexto extremamente rígido por valores e padrões culturais, mas pode se desvencilhar deles quando sente a falta de se unir ao eterno amor de DEUS; primeiramente experimenta o vazio e logo em seguida a salvação alcançada ao encontrar milagrosamente uma nascente de águas vivas emergindo pacificamente.

É através desse confronto entre nossa liberdade individual e o determinismo que vem nos submeter sobre um certo contexto (muitas vezes nos prendendo numa condição delicada), que aprendemos o segredo de nos tornarmos indivíduos mais autênticos; nessa dialética, somos postos a todo o momento por provas, até que finalmente chegue um momento da vida que somos capazes de colher os frutos que tão laboriosamente semeamos!

Nada mais árduo e delicado para a vida daqueles que tomaram a resolução de ser verdadeiramente livres e, com essa resolução, se aproximarem do amor proveniente de DEUS e se sentirem, dorovante, fortes para desenvolverem (tal como uma árvore que dá frutos na hora certa), as suas potencialidades sob os desígnios supremos do Pai celestial: sempre misericordioso para conceder talentos, especialmente àqueles que exaltam seu nome com grande amor e fervor de coração.

Muitas vezes reflito sobre a existência de quem nunca soube o que é o amor (...) uma existência que está desprovida de tal dávida, perde a oportunidade de encontrar a fonte suprema da felicidade em DEUS; e mesmo sem saber que este preserva sua vida, morre espiritualmente ao se afundar no vazio de uma existência desprovida de sentido (...)

Vejo o quanto uma pessoa nessas condições está limitada por uma condição que ela mesma ajudou a construir, sem semear no mundo nada mais além do que o seu vazio e a vanidade de seu existir. Em vista do que eu disse, não deixo de mencionar uma frase belíssima do apóstolo PAULO, uma das mais conhecidas e emblemáticas do novo testamento, que resume muito bem o que eu disse: ''Ainda que eu fale todas as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor sou como o bronze que soa ou o sino que retine... mesmo que tivesse toda a fé a ponto de, transportar montanhas, se não tiver amor, não serei nada''. É um belo mandamento ao amor e um hino a caridade sem dúvida, ensina muito o ser humano a refletir sobre essa questão, a meu ver uma das mais importantes questões filosóficas que precisa ser repensada com toda nossa capacidade de meditar!

Por mais conhecimento e sabedoria que possamos adquirir durante a nossa vida, se não tivermos capacidade de amar, dando abertura ao outro para o diálogo, para a escuta e para a compreensão de sua história de vida, francamente nada faria sentido nesse mundo, a vida seria tão opaca e desprovida de uma razão, que nesse caso seria preferível não estarmos vivos para testemunharmos tanto sofrimento e luta permanente entre os homens.

Pelo amor conseguimos nos compadecer de quem sofre e assim nos engajarmos, a fim de tornar a vida desse indivíduo mais aprazível para se viver; às vezes penso eu que as palavras, pronunciadas através do questionamento e das indagações, são ferramentes poderosíssimas, elas podem sim auxiliar no cuidado do indivíduo consigo mesmo, dando possibilidades para este (re)pensar sua própria existência e sua trajetória de vida.

Quando o amor prevalece no encontro de dois indivíduos, sua verdade se manifesta através das palavras pronunciadas, palavras dotadas de ternura, carinho e benevolência. São elas, portanto, ferramentas preciosíssimas para quem se esforça em praticar belos ensinamentos de amor, e também uma ferramenta fantástica para quem almeja semear no terreno do coração frutos duradouros de redenção e virtude sem precedentes.O amor é uma arte, também uma fortaleza que só pode provir de DEUS. Quão grande é a força que emana do rei supremo da eternidade!

Só o amor, semeado amplamente por Jesus Cristo na cruz, é capaz de nos reconstruir por inteiro; um amor que só pode ser proveniente de Deus, o único que pode nos suprir com essa dádiva maior! O amor que não é falsificado pela falta de sinceridade e pelo endurecimento de um coração petrificado, mas sim o amor que nos dá esperança de que a vida vale a pena ser bem vivida com toda paixão! E, além disso, a certeza íntima de que os melhores acontecimentos da vida só podem ser escritos sob os desígnios misteriosos de Deus! A vida só é bela e ricamente vivenciada quando podemos levar adiante o amor de Deus, semeando-o à quem necessita dessa fonte preciosa (...) Se temos a dimensão da liberdade para irradiar belos ensinamentos de amor, porque não darmos nossa contribuição, aquecermos corações tão esfriados pela miséria espiritual e pela ausência de qualquer estima pela vida? A égide do amor pode romper com tantas ilusões (...) E enquanto formos livres para manifestar gestos sublimes e semear atitudes de grande valor, repletas de verdade e lirismo, conseguiremos vencer o cárcere sobre o qual muitas vidas permanecem acorrentadas e esmagadas.

Alessandro Nogueira
Enviado por Alessandro Nogueira em 05/11/2016
Reeditado em 22/08/2017
Código do texto: T5814035
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